Batalha Espiritual

Batalha Espiritual – Capítulo 12

Pérgamo

Uma semana se passou depois do desentendimento entre Ophir e Serena. Francine estava, durante esse tempo, organizando todos os detalhes para que o suposto templo de Micael fosse erguido. O jovem acompanhava a rainha e avaliava até mesmo os tijolos usados na construção, apesar de sua opinião ser delicadamente ignorada. Não é novidade nenhuma dizer que as majestades pouco se importavam com os adoradores da única deidade… Na realidade, o ambiente de adoração era seu foco.

– Não acho que colocar todas essas estátuas seja necessário… Para que elas servem, senhora? – o rapaz observava todos os vidros coloridos do local e as diversas imagens de esculturas que ali estavam.

– Para serem adoradas. Para que mais?

– Somente Micael deve ser adorado.

– Ah, por favor, não me venha com essa conversinha. São só representações de santos que merecem o nosso respeito.

– Se for para respeitar algum servo de Micael, eu respeitarei. Contudo, não enxergo necessidade de eles serem idolatrados…

– Não enxergas muitas coisas. Tu não possui um panorama amplo do que há por trás de nada. É apenas um humano. – Lucian compareceu ao espaço. – Tome. Leia os novos dogmas da capela.

– Eu não concordei com novos dogmas!

– Se não tivesse concordado, não teria assinado o trato.

Ophir havia sido ludibriado. Ele se esforçava para enxergar o lado bom daquelas normas inventadas aleatoriamente que haviam infiltrado ali, porém, por mais que tentasse, não conseguia. O rapaz sabia que estava tudo errado, sabia que um castigo viria sobre todo aquele que se envolvesse. O que fazer a respeito então?

As mudanças poderiam ser pequenas, entretanto, não deixavam de ser mudanças. Aceitar aquilo era como dizer que as leis da potestade não eram suficientemente boas e eficazes para afastar o mal. Apesar disso, seu coração estava fortemente ligado às pessoas que sofreram pela fé e, de qualquer maneira, ele queria acabar com todo aquele martírio. O Edito de Tolerância já havia sido apresentado à sociedade por Draco, agora, o rapaz deveria contribuir com sua parte: converter pessoas à religião pagã disfarçada.

Após calar-se perante tal afronta espiritual, Ophir retirou-se dali. Precisava pensar um pouco.

– Por que permitiu que isso acontecesse? – Micael apareceu para ele.

– Senhor! – prostrou-se. – Lamento! Eu não sabia que acabaria assim! Apenas desejei que o rei nos protegesse.

– Aceitas a mim como líder?

– De fato! És a única razão para eu ter cometido tal estupidez, alteza…

– Então por que não me viste como seu verdadeiro rei e protetor? – não houve resposta. – Tens duas opções: permanecer com o inimigo ou fugir para estar junto a mim… Não te obrigarei a nada. Somente não é o meu querer que tu esqueças que sou o único que realmente te ama nesta história. Tenha conhecimento de que se não te unires a mim e te arrependeres, será minha obrigação fazer justiça no dia de minha vinda. Não é um blefe, filho querido… Tampouco uma ameaça.

Enquanto Ophir acanhava-se cada vez mais, Lucian retornara para seu castelo e entrara no congresso secreto que se localizava no solo abaixo das masmorras. Muitos anjos caídos estavam presentes e o som de suas discussões era perturbador:

– Não acho que seja um bom plano!

– Calado! Tu vistes que Draco tem ótimas estratégias para plantar o caos nas mentes humanas! Por que persistes em reclamar?

– Ambos estão errados! Ao invés de estarmos nesse parlamento infeliz, deveríamos ficar na vila, estragando cada segundo de vida desses seres paradoxais! São capazes de matar uns aos outros por causa daquela porcaria que inventamos: o dinheiro. Deveríamos investir nesse aspecto!

– Silêncio. – Lucian nem precisou gritar para chamar a atenção dos demais. – Fizeram o que ordenei?

– Sim! Sua besta está devidamente preparada. Apresento-vos: Pontifex Maximus! – um dos anjos anunciou e abriu quase que uma passagem secreta no chão. Das águas que preenchiam a passagem, surgiu um homem com cadeias no pescoço. Seus olhos não podiam ser percebidos, porque mirava o chão e seus cabelos encharcados os tapavam. Utilizava roupas brancas adornadas com ouro em excesso. Tinha aparência inofensiva, apesar da entrada misteriosamente peculiar.

– É um prazer conhecer a “autoridade máxima” dos meus novos esquemas. – o antigo regente do coro celestial segurou a face molhada da besta de maneira bruta. A própria permaneceu quieta.

Distante dali, Serena não se sentia bem após os resultados do desentendimento. Caminhava, exteriormente solitária, sobre a montanha que havia se tornado seu lar. Ela ia em direção a uma biblioteca. Segurava seu precioso livro nas mãos.

Quando chegou no ponto desejado, adentrou. Contudo, não tinha ninguém ali. A jovem estava triste. Queria distrair-se de alguma forma. Então, passando, observou todos os rolos de pergaminho guardados. No total, eram duzentos mil. Lembrou-se da escassez de papiro, a folha anteriormente usada para fabricar pergaminhos, que fora causada por motivos políticos. Isso não tinha nada a ver com seus problemas, mas não importava. Ela estava tentando desligar sua mente de todo e qualquer tipo de dificuldade naquele instante. Por que ela sofria tanto se procurava fazer o certo? Por que seu segundo melhor amigo a abandonara? Ela realmente parecia autoritária por querer tomar conta de seu povo?… A garota não sabia contestar as interrogações em sua cabeça.

Ela queria que seu amigo retornasse, porque ele aparecera no momento em que mais precisava e isso, obviamente, fora obra de seu amado. Ophir lhe era como um presente de seu rei, assim como todos os outros poucos que permaneceram na crença pura, sem a deturpação dos líderes terrenos.

Serena tinha a incessante vontade de ir atrás do rapaz para tentar uma reconciliação. Na época de perseguição, era natural que se sentisse sozinha na maioria dos momentos. Levantando-se, planejou ir atrás dele, onde quer que fosse.

– Não faças isso. Não misture-se com aquela gente. – a moça ouviu uma voz familiar. De fato, tinha certeza de quem era.

– Eu preciso… – respondeu com a voz baixa e amargurada.

– Não há ninguém melhor que eu para dizer o que tu precisas.
Seu desejo era contestar, mas meramente perguntou:

– Passar por todo esse sofrimento é o que preciso? Morrer seria mais misericordioso da tua parte, meu amor…

– Pensas mesmo que era meu desejo ver-te angustiada dessa forma? – apareceu fisicamente para ela na biblioteca. – Desobedeceste-me, sabendo que sou justo. Nem deverias estar viva por isso… Contudo, amo-te. Nunca me cansarei de demonstrar e dizer. Não era o meu gosto que vós sofrêsseis de tal jeito. Porém, há um lado bom… Podereis amadurecer-vos e fortalecer-vos. O que não vos mata, mais forte vos torna!

– Mas estamos morrendo, Micael! Estamos morrendo! Tu vistes! Tu o sabes! – o desespero transbordou em seus olhos.

– Quem morre em mim, vive. Crês tu? – aproximou-se meigamente. – Eles serão recompensados pelo o que passaram. Tu precisas permanecer forte, amada. Eu sei que consegues.

– Não consigo…

– E eu consigo?

– Tu? Certamente consegues… Mas não sou tu.

– Entretanto, estou contigo. Não adianta? – a deidade sorriu de canto, enxugando as lágrimas delas, e fez com que sua noiva gargalhasse rapidamente.

– Adianta muito!…

– Então consegues! – segurando-a, colocou-a sentada sobre o balcão. – Como eu te amo, como eu te amo… – sussurrou e, com seus olhos fechados, tocou seu nariz no dela, e, aos poucos, a moça ia ficando feliz. – Isso! Sorria! Triste… Não quero ver-te triste… Porém, sem fé em mim, tu serás sempre triste… A tristeza que sentes agora não se compara com a alegria que te trarei, prometo. Fique comigo… Fique comigo pela eternidade.

– É o que pretendo… – o abraçou.

– Ainda tens o livro que te dei? – soltou-a após alguns minutos.

– De fato!

– Eles idealizam destruí-lo…

– O que?! Por quê?! Não é justo! Tu me deste o livro para compartilhar a mensagem que está nele! Quem seria capaz de querer anulá-lo?!

– Uma besta, selecionada por Lucian, controlará as questões sociais, políticas e espirituais dessas terras. – Serena, com sua respiração interrompida, teve uma breve visão de como era. – Ela será a dirigente do templo que Francine construiu e dos que ainda determinará construir.

– Essa tal besta não me parece intimidadora… É apenas um homem!

– Não se iluda. Lucian também não parecia intimidador quanto te enganou. A besta procurará ignorar as palavras do livro e agir como quiser. Quem pensar o contrário, será herege. Poder, para ela, é a única coisa que importa. O povo passará a acreditar que ela é o meu substituto.

– As pessoas realmente acreditarão nisso?!

– Infelizmente sim. Elas deixaram de confiar no fato de que tudo que proponho é para o bem de vós… Irão apenas executar o que a besta manda, sem se questionar. Será como uma lavagem cerebral.

– Dê-me forças para não ser enganada… Por favor… – apertou o tecido de seu vestido, não queria traí-lo novamente.

– Serei seu consolador… Dar-te-ei sabedoria para discernir as mais implícitas blasfêmias se aceitares.

– Aceito!… Mas… Se me enganarem… Por favor, por favor, me alerte! Não quero mais pecar contra ti.

– Atenderei seu pedido. Não se preocupe, minha flor. Leia o livro e saberá o que fazer… – disse Micael, segurando a mão de Serena.

“Arrepende-te, pois, quando não em breve virei a ti, e contra eles batalharei com a espada da minha boca.”
Apocalipse 2:16

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