O Diário de um Nerd

O Diário de Um Nerd – Capítulo 01

Capítulo 01
Guerra de Bolas

“Todos os dias são tão maravilhosos, e de repente, fica difícil respirar. De vez em quando, eu me sinto inseguro de tanta dor e fico tão envergonhado. Todos somos bonitos, não importa o que eles digam. Christina Aguilera – Beautiful.

Cena 01 – Quarto de Léo. Noite.
O jovem Pedro Leonardo entra em seu pequeno quarto e fecha a porta. O garoto de mais ou menos 14 anos senta-se na escrivaninha que tem no canto da parede. Em cima da mesinha está seu notebook, que é também seu diário. Ele abre o notebook e o liga. O garoto vai logo no aplicativo Microsoft Word e começa a escrever mais uma página do seu diário.
Léo, digitando: Querido diário, o dia hoje na escola foi, bem… Foi incrível, pra não dizer muito. Eu e meus novos amigos estamos nos divertindo horrores, estamos bem unidos, é tudo muito animado. Em certos momentos até me assusto, penso que tudo não passa de um sonho e que posso acordar a qualquer instante, isso e pelo fato de que eu acabe me desconcentrando dos estudos com essa euforia toda que tem sido esses dias. Honestamente, eu até agora não sabia como era esse tipo de situação, me sentir querido, bem-vindo, é tudo muito novo, é estranho e ao mesmo tempo muito bom.
O garoto para de escrever. Lhe vem algumas imagens na memória. Um rápido flashback e ele vê várias pessoas, adolescentes da sua idade rindo muito, apontando para ele, ele está agachado no chão, encolhido, cobrindo o rosto com os braços e deixando escorrer uma lágrima pelo rosto. De repente lhe vem outra, ele está sentindo vários golpes fortes no estômago, e quem está lhe acertando é outro jovem de sua idade que parece furioso com sangue nos olhos. Lhe vem outra, mas diferente, nesta, vê-se apenas duas mãos, uma delas segura um estilete que está prestes a cortar os pulsos da outra.
Léo volta a si. Ele olha para as linhas escritas no monitor do notebook. Ele volta a escrever.
Léo, digitando: Claro que nem sempre tudo foi assim. Há alguns tempos as coisas eram muito diferentes!
Ele para de escrever de novo e meio que fica olhando para o além e lhe vem a cabeça mais lembranças.

ALGUNS MESES ATRÁS.
Cena 02 – Escola Elementar. Manhã.
Os carros e motos passam na pista em frente à escola Elementar, uma das escolas mais bem reconhecidas e de melhor desempenho de sua região.
No interior da escola os alunos estão tendo aula. Há turmas desde o Fundamental ao Ensino Médio na escola. É uma escola normal, tão normal que dentro dessa escola, assim como em muitas outras, ocorrem coisas horríveis. Para uns a escola é um local de aprendizado, para outros é uma chateação, mas para alguns, a escola pode ser até mesmo o próprio inferno.
Em uma das turmas do Ensino Médio, os alunos estão tendo aula. Não há nada de anormal na sala, a professora de matemática, Jose, está corrigindo algumas provas enquanto a maioria dos alunos está conversando. Pode-se notar além aos vários acentos com alunos de 15 a 18 anos, um único garoto isolado, bem no final da sala, como dizem, o fundão. O garoto usa óculos grandes, está vestindo um casaco grosso mesmo estando um dia quente e o cabelo está penteado como o de um mauricinho. Este é Pedro Leonardo, ou como dito antes, simplesmente Léo, o nerd da turma, ou como muitos o chamam, “o esquisitão”.
A professora põe-se de pé com um monte de papéis nas mãos.
Jose, em um tom alto: Alunos, silêncio!
Os alunos não a ouvem. A professora então bate na sua mesa, fazendo um barulho que atrai a atenção doa turma.
Jose, mais alto: Silêncio! Muito bem turma, eu corrigi todas as provas de vocês e aqui estão elas. Devo dizer que os resultados não foram satisfatórios e eu creio que possamos melhorar isso, certo?
A professora começa a distribuir uma por uma todas as provas, ela chama os alunos e estes se levantam e pegam sua prova. Ouvem-se alguns resmungos entre os alunos, como “Só isso?”, “Essa nota deve estar errada”, “Não acredito, me dei mal”, “Droga, recuperação de novo”, etc.
O último a receber a prova é coincidentemente o último aluno da turma, o que senta no fim. Léo se levanta e caminha tímido até a frente da sala.
Jose, entregando a prova ao garoto: Meus parabéns Leonardo, mais uma vez se saiu bem, sua nota foi uma das melhores!
O garoto senta-se no fim da turma. Os outros jovens começam a encará-lo com um certo desprezo. Alguns dizem “Esse esquisitão se acha o melhor”, “Ele bajula os professores”, “Não se mistura com ninguém porque se sente melhor que nós”.
Léo ouve tudo, mas não argumenta. Ele simplesmente senta-se na sua cadeira e começa a conferir as suas questões.

Cena 03 – Um tempo depois.
A professora já saiu da sala. Os alunos estão aproveitando para conversar durante o pequeno tempo entre a troca de horários.
Um dos alunos mais problemáticos da turma, Paulo, está junto de seu amigo Davi. Os dois observam Léo sozinho e isolado no canto da sala.
Paulo: Esse nerd ali é muito do bizarro mesmo.
Davi: É verdade, olha como ele fica admirando aquela nota 10, parece que é um troféu, quem é que aguenta?
Paulo, esfregando as mãos: Eu tive uma ideia!
Davi: Que ideia?
Paulo, sorrindo ironicamente: Vou me divertir um pouco, fiquem só observando.
Davi fica onde está enquanto Paulo se aproxima da carteira de Léo. O menino está distraído lendo sua prova. Paulo de repente simplesmente tira a prova das mãos de Léo.
Paulo, irônico: Pois é, todos nós tiramos notas baixas nas provas, menos você, né? “Meus parabéns Leonardo, se saiu bem como sempre”.
Léo estende a mão, meio tímido: Por favor, me devolve?!
Paulo, irônico: “Por favor, me devolve”, aff… Deixa eu ver isso aqui… Um 10!
Léo: Me devolve minha prova.
Paulo: Pra que você quer isso hein?
Léo: Só me devolve.
Paulo: Ah claro, como você prefere? Amassada…
Paulo só faz amassar a prova Léo. O garoto se levanta e tenta pegá-la de volta, mas com um só braço Paulo empurra o garoto e o faz cair no chão. Léo bate o cotovelo ao cair.
Paulo, desamassando e rasgando a prova: Ou prefere como confete?
O garoto joga os pedaços da prova rasgada em cima do colega. Léo, nervoso começa a pegar os papéis da sua prova. Paulo vai até sua carteira e arranca algumas folhas de seu caderno e as amassa fazendo bolas.
Paulo: Ah, então você quer papel, é?
Paulo começa a jogar bolas de papel em Léo. Meio que sem razão alguma, os demais alunos veem a cena e começam a entrar na brincadeira. Eles arrancam folhas de seus cadernos, amassam e jogam elas em Léo, fazendo a maior algazarra. Léo está no canto da parede e é bombardeado várias vezes, é muito humilhante.
Os alunos gritam e riem, eles dizem algo como “Pegue isso” repetidas vezes. Eles riem. Léo cobre o rosto com os braços enquanto mais e mais bolas de papel o atingem. O garoto deixa escorrer uma lágrima de seus olhos.
De repente, o professor de Educação Física, Sérgio, ouve a gritaria e entra na sala.
Sérgio, alto: Mas que bagunça é essa? O que está havendo?
Ele se aproxima do montão de alunos amontoados no canto da parede. Ele vai abrindo caminho entre eles, empurrando-os e tomando as bolas de papel de suas mãos.
Sérgio: Já chega! Parem com isso! Isso aqui não é uma balada!
Sérgio afasta os alunos e consegue avistar Léo sentado e encolhido no canto da parede. Ele se abaixa perto do garoto.
Sérgio: Leonardo, o que aconteceu aqui?
Léo não responde, ele soluça segurando o choro.
Sérgio: O que houve? Por que fizeram isso?
O menino não responde nada. Sérgio então o puxa pelo braço e o ajuda a levantar. Ainda ouvem-se algumas risadas pela sala.
Sérgio: Silêncio todos vocês! Por acaso acham bonito o que fizeram?
Os alunos não respondem. Sérgio leva Léo para fora da sala.

Cena 04 – Diretoria.
O professor levou Léo para a diretoria após o incidente. O garoto está sentado bem ao lado dele na mesa da diretora. Sérgio explica a situação e todo o ocorrido para a diretor da escola, senhora Edna. A mulher ouve a história e fica chocada.
Edna: Me desculpe, mas você disse todos os alunos?
Sérgio: Todos, a turma inteira! Estavam jogando bolas de papel nele.
Edna: Mas sabe me dizer por que isso?
Sérgio: não sei ao certo, mas imagino.
Edna: E o que seria?
Sérgio: Até onde sei, Leonardo sempre foi o bode expiatório daquela turma, ele é um bom aluno, é comportado, quieto, estudioso, mas ele chega a ser muito isolado e também tem dificuldade nos esportes.
Edna: Como ele se sai na sua aula?
Sérgio: Outro dia eu pedi para ele participar, mas ele acabou levando uma bolada na cabeça e teve que parar. O que eu notei é que ele não é nem um pouco acostumado a praticar esportes, ele jogou pouco e mesmo assim saiu do jogo quase sem conseguir respirar, e falando a verdade, ele joga muito mal.
Edna: Eu reparo que ele é calado, esse tempo todo não disse uma palavra. E de fato, todos os professores me falam bem dele, é um aluno exemplar.
Sérgio: Outro dia o próprio zelador da escola me disse que o garoto é muito isolado, ele praticamente não tem amigos, não se inclui, não se mistura, isso muitos de nós podemos notar.
Edna: Bem, isso é pouco provável porque numa escola grande como essa com tantos alunos, como ele pode ser solitário?
Sérgio: Diretora, a senhora sabe que nem todos têm o mesmo respeito pelos mais “certinhos” hoje em dia. Bem, mudando de assunto, mas nem tanto, eu creio que a senhora a de dar um castigo naqueles alunos, certo?
Edna: Bem, se você disse que foram todos os alunos eu não posso suspender, é uma turma grande. O máximo que eu posso é aplicar algum castigo.
Sérgio: Nesse caso, peço que deixe o castigo por minha conta.
Edna: Então está bem.
Edna abre a gaveta da mesinha e pega um passe. Ela olha para Léo, que continua cabisbaixo e em silêncio.
Edna entrega o passe: Bem, então é melhor você ir pra casa, aproveite seu dia e sentimos muito por esse incidente.
Léo não diz uma palavra, ele simplesmente se levanta e sai cabisbaixo da diretoria. Com um milhão de pensamentos, mágoas e dores misturados.
A diretora olha para o professor Sérgio preocupada.
Edna: Eu temo pela vida desse garoto!
Sérgio: Como assim diretora?
Edna: Já conheci muitos casos de alunos como ele ao longo dos meus anos nas escolas, e posso dizer que alguns terminaram em tragédia.

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