A Dona da História

A Dona da História – Capítulo 02

CENA 01. MANSÃO CASTILHO. SALA DE ESTAR/ INT./ DIA.

CONTINUAÇÃO IMEDIATA DA ÚLTIMA CENA DO CAPÍTULO ANTERIOR.

 Romero está sentado, lendo jornal, quando a campainha toca. Ele para de ler, se levanta e vai atender.

ROMERO (surpreso) – Você?

Nesse instante Lauren entra desesperada.

LAUREN (muito aflita) – Desculpa vir sem avisar e atrapalhar o seu descanso, Romero. Mas o que eu venho dizer é de extrema urgência.

ROMERO – Entra, senta. Quer um copo d’água?

LAUREN – Não quero nada. Eu só vim te dar essa notícia.

ROMERO – Então fala, pelo seu estado de nervos, deve ser coisa séria.

Lauren respira fundo.

LAUREN – Eu tô grávida e o pai é você.

ROMERO (surpreso) – O que?

LAUREN (cabisbaixa) – Infelizmente, Romero, aquela noite que a gente acabou esticando até a minha casa, você sabe o que rolou, e…/

ROMERO (corta) – Desculpa ser grosseiro, mas de verdade, eu não lembro de nada do que aconteceu.

LAUREN – Mas isso não modifica o que aconteceu. Você bebeu um pouco a mais e deve ter tido amnésia. O fato é que a gente transou sem proteção e agora eu recebi a notícia que estou grávida.

ROMERO – E qual a chance desse filho ser meu?

Lauren simula um falso choro.

ROMERO (atencioso) – Desculpa moça, mas eu não quis ofender.

LAUREN (falsa ofensa) – Não sou moça, sou Lauren Fischer. Romero, as chances desse bebê que estou esperando ser seu, é cem por cento. Eu não sou uma mulher dada às relações amorosas, ou mesmo, ao sexo. De fato, eu acabei gostando de você naquela festa. Te achei bonito, educado e acabou acontecendo. Eu não vim aqui exigir que registre a criança, nem que case comigo, até porque, todos nós sabemos que filho nunca segurou homem. Eu vim aqui, te informar sobre essa novidade. Acho que eu, como futura mãe, devo essa satisfação a você. Agora cabe a você decidir se quer essa criança ou não. Não tô exigindo nada.

Lauren vira as costas para sair da sala.

ROMERO – Lauren espera!

Lauren para e vira-se para Romero.

ROMERO – Eu queria dizer que fico muito feliz com essa notícia. Claro que me pegou de surpresa, mas não deixou de ser menos importante. Eu tô muito feliz com a ideia de ser pai. Sempre foi meu sonho.

LAUREN (feliz) – Eu sei que é uma dificuldade criar filho, hoje em dia, sozinha. Mas a nossa criança vai ter que entender que os pais não vivem juntos. Acho que pra isso existe a guarda compartilhada. De início é ruim pro psicológico da criança, saber que tem duas casas, que tem dois quartos, mas acho que nada que alguns bons anos de análise não façam efeito.

ROMERO – Eu faço de tudo para que nosso filho cresça bem. Sem transtornos psicológicos, sem nenhum carma.

LAUREN – Tudo?

ROMERO (convicto) – Tudo!

Lauren e Romero ficam se olhando.

CORTA PARA:

CENA 02. AP. FRANCO/ SALA/ INT./ DIA.

Franco está sentado no chão e com uma garrafa de cachaça nas mãos, visivelmente bêbado e triste. Está com o rádio ligado, tocando “POR ONDE ANDEI – NANDO REIS”.

Close em Franco, pensativo.

***INSERT DO FLASHBACK DO CAP 01, CENA 26.***.

Lauren e Franco, desnudos, deitados na cama.

Lauren dá um beijo avassalador em Franco.

FRANCO (meio sem ar) – Calma aí, princesa, tô meio sem ar.

LAUREN – Frouxo. Tem que ter pegada. Pra ser meu namorado, tem que ter pegada. Gosto de muita pegada.

FRANCO (FELIZ) – Então quer dizer que eu sou o seu namorado?

LAUREN – E futuramente será meu esposo. Serei a Senhora Franco Lucci Vaz. Não vejo a hora de jogar esse Fischer na lixeira.

FRANCO (puxando Lauren pra si) – Então vem aqui gostosa. Hoje eu vou dar muito prazer a minha namorada. Só minha, toda minha.

Franco e Lauren começam a se agarrar e a se beijar com muita excitação.

***FIM DO FLASHBACK***

Franco dá mais uma golada na garrafa de cachaça.

FRANCO – Me diz meu Deus, como é que a vida pode ser assim com a gente? Eu tenho certeza que a Lauren me ama, que sempre gostou de mim. Aliás, eu não tenho mais certeza de nada. O sentimento da gente acaba sendo irrelevante nesses momentos.

Franco se levanta com um pouco de dificuldade, dá mais uma golada na garrafa de cachaça, e em seguida, a joga contra a parede.

FRANCO – Diante do senhor, meu pai, uma promessa eu faço aqui e agora: Eu, Franco Lucci, fecho o meu coração para o amor. Não quero mais saber de mulher nenhuma. Quero elas para satisfazerem minhas necessidades biológicas e só. Amar? Amar eu não quero mais. Todo o sentimento que existia dentro de mim, toda a nobreza e a leveza que essa construção amorosa faz, a Lauren conseguiu derrubar, passar por cima e matar. Eu nunca mais vou amar. NUNCA MAIS!

Franco cai no chão novamente, em um choro descontrolado.

CORTA PARA:

CENA 03. SÃO PAULO/ PONTOS TURÍSTICOS/ EXT./ DIA.

(MÚSICA “GARGANTA” – ANA CAROLINA). Imagens dos principais pontos turísticos de São Paulo.

CORTA PARA:

CENA 04. SÃO PAULO/ ABRIGO DE MENORES/ FACHADA/ EXT. DIA/

Imagens de um casarão em estilo colonial, muito deteriorado pelo tempo e cercado por enormes muros brancos e acima dos muros, cercas de arame farpado.

CORTA PARA:

CENA 05. ABRIGO DE MENORES/ PÁTIO/ EXT./ DIA.

Eduarda e Gisela estão solitárias, varrendo o enorme pátio.

GISELA – Eduarda, onde está todo mundo?

Eduarda para de varrer e se aproxima de Gisela.

EDUARDA – Todo mundo tá fazendo alguma tarefa. O Alencar, junto com os outros meninos, está na horta, é um terreno aqui ao lado.

GISELA – E por que eles não fogem?

EDUARDA – E fugir pra onde? Você olhou ao redor? Aqui é um lugar longe de tudo e perto do nada. Não tem como fugir, sair ou sumir. E se o Miranda achar é pior, porque ele bate, faz coisas feias com as nossas partes íntimas.

Gisela tem um impulso nervoso passageiro.

EDUARDA – Eu sei o que é isso. Só de imaginar, eu também ficava assim. Aquele homem nojento.

GISELA – Mas nojenta ainda é a minha mãe, aquela assassina.

EDUARDA – Assassina?

GISELA – Não contente em ter matado o meu pai, ela quis sumir comigo da vida dela.

EDUARDA – Então agradeça a Deus, por você ter parado aqui, e não em uma cova rasa de um terreno baldio. (T) Agora trata de continuar varrendo esse pátio, antes que o General Miranda volte.

Eduarda e Gisela voltam a varrer o pátio.

CORTA PARA:

CENA 06. NOVA ALIANÇA/ PONTOS TURÍSTICOS/ EXT./ DIA-NOITE.

(MÚSICA “GENTILEZA” – MARISA MONTE). Imagens dos pontos turísticos da cidade, tais como: Ruas movimentadas, Clubes, casas de festas, Cruzeiro, etc.

Transposição do dia para a noite.

(FADE OUT TRILHA).

CORTA PARA:

CENA 07. AP. BRANCA/ SALA DE JANTAR/ INT./ NOITE.

Branca e Lauren estão sentadas a mesa jantando.

BRANCA – Escuta aqui, Lauren, já tem uns três meses que você deixou a Gisela naquele orfanato, abrigo, sei lá o nome. Não vai ligar pra saber como ela está?

LAUREN – Mamãe, o dia que eu deixei a Gisela naquele abrigo, era porque eu estava iniciando uma nova fase na minha vida, e ela, não cabe nessa nova fase. Não tem porque eu ficar ligando. Deixa a garota lá, ela é tinhosa igualzinha ao Ivan, vai aprender a se virar.

BRANCA – Não sei que nova fase é essa. Não vejo resultado nenhum, nunca. Tô cansada de viver nessa pindaíba. Se não fosse a pensão do falecido Giácomo e os caraminguados que eu tenho que pedir a Mouriel, nós duas estaríamos a ver navios, fique ciente disso.

LAUREN – Hoje eu dei o mais importante dos passos nessa nova fase. Eu fui à casa do Romero e disse a ele que estava grávida.

BRANCA – Mas você está?

LAUREN – É lógico, mamãe. Inventar barriga falsa só causa mais problemas.

BRANCA – Eu se fosse você, tomaria muito cuidado. O Romero não vai engolir de primeira essa história de que o bebê é dele.

LAUREN – Mãe, eu sei o mato onde estou caçando, e posso te dizer uma coisa? É questão de tempo pro Romero estar aqui, comendo na palma da minha mão. Aprenda uma coisa: Homem bom é homem burro. E eu conheço meu eleitorado, esse daí só não é mais jumento, porque tem dinheiro.

BRANCA – Autoconfiança é uma coisa que nunca te faltou.

LAUREN – Ao menos uma coisa tinha que ser abundante na minha vida, já que o dinheiro sempre foi escasso.

Lauren e Branca continuam jantando.

CORTA PARA:

CENA 08. MANSÃO SIMPSON/ FACHADA FRONTAL/ EXT./ NOITE.

Imagens de um imenso jardim de flores campestres, iluminado por tochas de fogo e um jogo de luz que muda de cor a todo instante.

CORTA PARA:

CENA 09. MANSÃO SIMPSON/ SALA DE ESTAR/ INT./ NOITE.

Mouriel e Romero estão vindo da sala de jantar, sentam-se no sofá, um de frente para o outro.

MOURIEL – Um filho é coisa séria, Romero. Eu nunca tive, mas sei da responsabilidade que é.

ROMERO – Eu sei, mas acabou acontecendo. Fui um inconsequente. Eu queria muito ter um filho, constituir uma família, sabe? Ter essas coisas que todos têm. Eu sempre invejei meus amigos que casaram e tiveram filhos.

MOURIEL – Mas nem só de alegria vive uma família. Há de se pensar nas responsabilidades e nos problemas. Principalmente nos problemas, que serão muitos.

ROMERO – Eu sei disso Mouriel, mas tudo na vida tem seu pró e seu contra. Se eu ficar adiando isso, nunca terei uma família. Olha bem pra mim, já passei dos trinta e nem namorada eu tenho.

MOURIEL – Mas os tempos são outros. Não existe essa coisa de idade pra casar, quantidade certa de filhos. Você tem que estar em paz com você mesmo e, além de querer, tem condições financeiras, psicológicas e biológicas pra ser pai.

Romero fica pensativo.

MOURIEL – Eu tô enchendo a sua cabeça de lorota, desculpa. Mas é que eu não quero que você se arrependa, que sofra, ou pior, que faça essa criança, ou a mãe dela sofrer.

ROMERO – O melhor a fazer, é eu me casar com a Lauren e construir a minha família.

MOURIEL – Tem certeza disso?

ROMERO – Certeza nessa vida a gente só tem da morte. Mas acho que é o mais adequado a fazer. Eu fui um inconsequente de ter ido pra cama com uma desconhecida e ter esquecido de usar preservativo. Mas não adianta chorar em cima do leite derramado, o melhor a fazer é me casar com ela.

MOURIEL – Será mesmo? Acho que você não sente a menor quantidade de afeto pela Lauren. Fora que pelas suas palavras, parece que você tá se casando pra reparar um erro. Mas te digo, se casar sem amor é causar um erro maior ainda.

Romero fica muito pensativo.

CORTA PARA:

CENA 10. CASA DE LAURO/ QUARTO DO CASAL/ INT./ NOITE.

Isabel está deitada na cama assistindo TV. Pouco depois, Lauro chega, com roupa social.

LAURO – Boa noite.

Lauro vai até Isabel e lhe dá um selinho.

ISABEL – Demorou hein. Não acredito que estava atendendo clientes até essa hora.

Lauro começa a tirar sua roupa.

LAURO – Você se casou com um advogado minha querida, portanto, vai ter que se acostumar com a instabilidade de horários.

ISABEL – Diz pra esses clientes encrenqueiros que você tem família, tem esposa te esperando pra jantar, pra namorar um pouquinho.

LAURO – Você quer que eu chegue cedo em casa, ou quer ter suas contas pagas?

Isabel fica emburrada, não responde e olha para a TV. Lauro termina de se despir, ficando apenas de cueca e indo para o banheiro. Segundos depois, ouve-se o barulho do chuveiro ligado.

ISABEL (pra si) – Trabalhando? Sei. Enquanto o Lauro ia colher o milho, eu já estava vendendo a pamonha.

Isabel se levanta, sorrateiramente, e começa a mexer nos bolsos da roupa de Lauro, até que encontra a foto de uma menina, aparentando ter entre 12 e 13 anos. Ela bufa de ódio, guarda a foto em uma gaveta do armário e volta para a cama.

CORTA PARA:

CENA 11. SÃO PAULO/ PONTOS TURÍSTICOS/ EXT./ NOITE-DIA.

(MÚSICA “GARGANTA” – ANA CAROLINA). Transposição da noite para o dia com imagens dos principais pontos turísticos de São Paulo

CORTA PARA:

CENA 12. ABRIGO DE MENORES/ DORMITÓRIO/ INT./ DIA.

(FADE OUT TRILHA “GARGANTA” – ANA CAROLINA). Alencar, Eduarda, Gisela e outras crianças estão dormindo, quando ouvem um tiro.

ALENCAR (sonolento) – O que foi isso?

Eduarda e Gisela acordam.

GISELA – Eu ouvi um barulho, ou sonhei?

ALENCAR – Se você sonhou, foi com a mesma coisa que eu sonhei.

Ouve-se mais um barulho de tiro.

EDUARDA – Gente, não era sonho. Tá acontecendo alguma coisa. Acho melhor a gente ficar quieto.

GISELA – Não, eu vou lá fora ver o que é isso.

Gisela se levanta e sai do dormitório.

CORTA PARA:

CENA 13. ABRIGO DE MENORES/ VARANDA/ EXT./ DIA.

Gisela vai caminhando em direção ao pátio, até que vê Miranda caído no chão. Ela corre para próximo dele.

GISELA (assustada) – Miranda?

Miranda está caído, muito ensanguentado, com duas perfurações de tiro, agonizando.

MIRANDA (com muita dificuldade/ a Gisela) – Me ajuda… Por favor… Eu preciso de uma ambulância.

Gisela fica imóvel, olhando para Miranda.

MIRANDA (quase desfalecido) – Eu te suplico menina, me ajuda. Senão vou morrer.

Gisela se abaixa, ficando cara a cara com Miranda.

GISELA – Um dia da caça e outro do caçador. Lembra quando eu cheguei aqui e você abusou de mim? Eu implorei, supliquei, fiz de tudo pra você me deixar em paz, mas não adiantou. Você não quis saber, seu pedófilo de merda. Agora tá aí, dependendo de mim. Sabe o que eu vou fazer? Nada. Vou deixar você agonizar, suplicar pela vida. E sabe o que vai acontecer? Você vai morrer, aos poucos. Vai se rastejar feito cobra, mas no fim das contas vai morrer.

Miranda fica olhando para Gisela, até que dá o último suspiro e morre.

GISELA (emocionada) – Acabou! Acabou gente, acabou!

Nesse instante, varias crianças e alguns cuidadores chegam ao local e ficam chocados. Gisela vai saindo lentamente do local.

CORTA PARA:

CENA 14. MANSÃO SIMPSON/ SALA DE JANTAR/ INT/ DIA.

Mouriel está sentada a mesa, preparando-se para tomar o café da manhã, enquanto Santa a serve.

MOURIEL – Ai Santa, tô tão preocupada com o Romero.

SANTA – Romero é aquele ricaço que perdeu o pai?

MOURIEL – Esse mesmo. Tadinho vai ser pai.

SANTA – E por que a pena?

MOURIEL – Porque a mãe da criança é a Lauren. Não sei, sabe, mas algo não me cheira bem nessa história. Pode ser cisma minha, porque eu ultimamente ando cismada até com a minha própria sombra, mas a Lauren, junto da Branca armaram alguma coisa. Só pode.

SANTA – Essa tal de Lauren nunca me soou boa pessoa. Mas, sem provas a gente não pode acusar.

MOURIEL – Pois é, por isso me calei, mas plantei a semente da dúvida na cabeça dele.

SANTA – Por falar em dúvida, acho que teremos outra dúvida.

MOURIEL – Sobre o que?

SANTA – Uma vizinha minha que é prima do marido de uma agente carcerária, disse que a Maracutaia pode ter a pena reduzida.

MOURIEL – Jura? Não, tô boba com essa menina. Sabe, eu não sei se ela é a inocente ou a culpada da história, mas eu gosto de graça da Maracutaia. Espero que ela volte a ter uma vida social boa.

SANTA – Eu não coloco minha mão no fogo por ninguém.

Mouriel volta a tomar seu café da manhã e Santa sai da sala de jantar.

CORTA PARA:

CENA 15. AP. BRANCA/ SALA/ INT./ DIA.

Lauren está lustrando os móveis, quando Branca aparece.

BRANCA – O que eu faço pro almoço?

LAUREN – Qualquer coisa, menos picadinho com ovo. Não aguento mais comer ovo.

BRANCA – Levanta a mão pro céu e agradeça, pois o ovo será o próximo a deixar a nossa residência e ficaremos apenas com o chuchu.

LAUREN – Eu tenho uma economia guardada. A gente pede uma comida italiana, satisfeita?

BRANCA – Tá bem.

Lauren para de lustrar os móveis.

LAUREN – Ai mãe, não aguento mais ficar dando faxina nessa casa. A gente precisa contratar alguém. Olha a minha unha, tá preta e o esmalte já saiu quase todo.

BRANCA – Contratar é o de menos, mas e pagar, quem vai pagar? Porque eu tô no bico do anu. Não tenho dinheiro nem pra comprar meia dúzia de ovos. Você deveria era tratar de agilizar esse plano infalível, pois o Romero é a nossa única esperança. Se perder ele de vista, ah meu bem, vai ter que viver dando faxina, não só aqui, mas na casa de muitas dondocas por aí.

Lauren fica pensativa. A campainha toca. Branca vai atender, e olha pelo olho biônico.

LAUREN – Quem é? Vai dizer que é mais um mascate cobrando? Se for manda ir embora.

BRANCA (empolvorosa) – É o Romero. Vai lá pra dentro, toma banho, se arruma.

Lauren começa a pular de alegria.

BRANCA – Vai Lauren!

Lauren sai correndo para seu quarto. Branca atende a porta, toda sorridente.

BRANCA (atenciosa) – Olá. Romero, acertei?

ROMERO – Isso mesmo.

BRANCA – Entre, por favor. Só não repare a bagunça, é que a minha doméstica faltou hoje.

Romero entra.

BRANCA – Sente-se querido. Aceita um chá, um café, um suco?

ROMERO (se sentando) – Não, obrigado! Acabei de tomar café.

BRANCA – Ainda bem que não aceitou, é porque eu ainda não fui as compras e tô sem nada aqui.

ROMERO – Fim de mês é assim mesmo, o carro passa lá na rua e as nossas latas de mantimentos começam a balançar de tão vazias.

BRANCA – Você quer falar com a Lauren?

ROMERO – Sim, ela está?

BRANCA – Está terminando de sair do banho, vou falar pra ela que você está aqui.

Branca sai em direção ao quarto de Lauren.

CORTA PARA:

CENA 16. CASA DE LAURO/ SALA/ INT./ DIA.

Isabel está sentada no sofá, quando Lauro vem do quarto, todo arrumado e com uma maleta em mãos.

LAURO – Já vou pro escritório, tem um cliente chato que pediu urgência no estudo do caso dele.

ISABEL – Cliente homem, ou cliente mulher?

LAURO – Ih, sem cena de ciúmes logo pela manhã, por favor!

ISABEL – Talvez eu tenha motivos para ter ciúmes, não acha?

LAURO – Não, não acho. Acho até que essa colocação sua é rasa, primária e infundável.

Isabel se levanta.

ISABEL – Você pode achar isso, mas eu tenho as minhas provas concretas de que minha desconfiança não é algo tão sobrenatural assim. Aliás, a minha desconfiança tem cheiro, nome, rosto e voz.

LAURO – Você tá neurótica, Isabel. Eu tô trabalhando feito um cavalo pra te dar conforto, pra proporcionar uma vida mais tranquila pra gente e você vem me falar de desconfianças? Já não chega você ter demitido a empregada, que certamente foi por ciúmes, agora me vem com essas histórias capciosas. É demais pra mim. Só tome meu tempo, quando for algo de extrema relevância, caso contrário, me poupe dessas suas maluquices.

Isabel tira a foto da garota do bolso e mostra a Lauro.

ISABEL – Isso daqui é maluquice?

Lauro olha assustado para Isabel.

CORTA PARA:

CENA 17. AP. BRANCA/ QUARTO DE LAUREN/ INT./ DIA.

Lauren está se perfumando e ajeitando sua roupa de frente para o espelho. Branca está sentada na cama, olhando para Lauren.

LAUREN – O que a senhora acha mamãe? Tô apresentável?

BRANCA – Tá ótima. Agora não faz o moço ficar esperando lá na sala. E lembre-se: se for almoçar, vá a um restaurante, ou então, vai ter que oferecer picadinho de ovo pra ele, mas sem o ovo, porque tá sem aqui em casa.

LAUREN – Mania de pobreza a senhora sempre teve né?

BRANCA – Então tá na hora de você fazer diferente. Vá lá, seduz esse homem e faça a sua mãe não ter só mania de rica, mas uma vida de marani.

LAUREN – O que é marani?

BRANCA – Feminino de marajá, meu bem.

Lauren termina de se ajeitar e sai do quarto.

BRANCA (pra si) – Eu espero que dessa vez dê certo. Não aguento mais contar moeda. Pra mim não dá mais.

CORTA PARA:

CENA 18. AP. BRANCA/ SALA/ INT./ DIA.

Romero está sentado no sofá, quando Lauren aparece, muito feliz.

LAUREN (feliz) – Romero? Que surpresa mais agradável.

Romero se levanta e cumprimenta Lauren com dois beijinhos.

ROMERO – Me desculpa vir sem avisar, mas é que era muito importante.

LAUREN – Imagina, você nunca atrapalha, pelo contrário, fico feliz com a visita.

ROMERO (inseguro) – Eu acho que em primeiro lugar, devo-lhe desculpas.

LAUREN – De que?

ROMERO – Eu te tratei muito mal ontem à noite. Essa, com certeza, não foi a educação que meus pais me deram. Ainda mais você sendo a mãe do meu primogênito.

LAUREN – Não tem problema. É o nervosismo da hora. A adrenalina salta mesmo. Imagine só, chega uma mulher, que você viu uma vez na vida e te diz estar grávida de você, é de assustar mesmo.

ROMERO – Não vou mentir, eu fiquei muito encabulado com essa história. Mas acho que o meu dever como homem, é assumir as minhas responsabilidades perante você e a sociedade.

LAUREN – Romero, eu disse ontem e volto a dizer hoje, não se sinta obrigado a fazer o que você não quer ou que não está preparado. Não precisa tomar decisões com a cabeça quente. Eu gosto demais de você e tudo que eu mais quero nessa vida é o seu bem. Não quero que pare sua vida por mim, não quero que se arrependa. Vá devagar, deixa cada coisa ir acontecendo no seu tempo.

ROMERO – Você é tão bem educada, compreensiva. Sabe Lauren, eu fiquei com medo de tudo isso ser mais um golpe da barriga, como tantas outras dão por aí.

LAUREN – Eu nunca liguei pra dinheiro, pra posição social ou vida confortável. O que eu quero é ter alguém ao meu lado, alguém que eu goste, que constitua comigo uma família, entende?

ROMERO – É por isso que eu estou aqui, agora, de frente pra você. Eu pensei, me aconselhei, e o melhor pra minha vida, para nossas vidas, é que eu assuma essa criança. E não só isso, não só dá um sobrenome pra ela e um pai ausente às vezes. O que me trouxe aqui é algo bem maior.

Lauren fica ansiosa. Romero respira fundo.

ROMERO – O melhor para nós três nesse momento e o que mais quero é uma família completa. Por isso, Lauren, você aceita se casar comigo?

Lauren fica perplexa e ao mesmo tempo, altiva.

LAUREN – É o que você quer de verdade?

ROMERO – É o que precisa ser feito.

LAUREN – Não quero casamento de aparências, acho que a vida de casada deve ser…/

Romero interrompe a fala de Lauren com um beijo avassalador.

ROMERO – E agora, aceita ou não?

LAUREN – É claro que aceito!

ROMERO – Eu vou correr e pedir ao meu advogado que ajeite tudo.

Lauren dá um beijo em Romero e o leva até a porta. Lauren fecha a porta e começa a gargalhar, nesse instante, Branca entra aplaudindo.

BRANCA (aplaudindo) – Mas que bela atriz o teatro brasileiro está perdendo. Que texto convincente.

LAUREN – Eu te falei mamãe. Homem bom é homem burro. E esse Romero Castilho já está comendo na palma da minha mão. Eu estalo os dedos e ele vem latindo pro meu lado.

BRANCA – Vai se tornar a nova Castilho, parabéns!

LAUREN – Preciso ver para onde vou em lua de mel.

BRANCA – Nordeste. Ceará, Bahia.

LAUREN – A senhora é tosca mesmo. Gosta de bancar a ridícula por esporte, ou é defeito de fabricação?

BRANCA – O que eu disse demais?

LAUREN – Eu tô me casando com um milionário, e a senhora quer que eu vá em lua de mel para o Nordeste Brasileiro? Ah mamãe, a senhora deveria ser engolida por um furacão imenso, quando fosse dar descarga. Eu tô pensando em Europa, Tigres Asiáticos, Caribe, uma coisa mais refinada e longe desse país tosco e regressor.

BRANCA – Eu escolheria Paris.

LAUREN (pensativa) – Paris não é má ideia, é quem sabe eu não vá passar minha lua de mel lá. Um bom caso a se pensar.

Lauren e Branca continuam conversando.

CORTA PARA:

CENA 19. CASA DE LAURO/ SALA/ INT./ DIA.

Isabel está com a foto de uma garota em mãos, enquanto Lauro permanece mudo.

ISABEL – Vai permanecer mudo? O que foi? O gato mordeu sua língua, ou você está pensando numa desculpa esfarrapada pra me dar?

Lauro se senta no sofá.

ISABEL – Eu tô esperando uma resposta, Lauro, vai, me diz de uma vez quem é essa garota da foto que eu encontrei no meio da sua roupa.

LAURO – Você se rebaixou a ponto de começar a fuçar nas minhas roupas?

ISABEL – Eu não fucei nas suas coisas. Eu peguei a sua roupa pra colocar pra lavar e essa foto caiu. Aí eu quis saber quem é a ninfeta.

LAURO – Isso é obsessão, é ciúme doentio. Essa garota da foto é a Danielle. Uma menina que foi sequestrada no colégio e os pais estão desesperados. Vieram até mim, porque querem processar a escola.

ISABEL – E você acha que eu vou cair nessa? Por que a foto?

LAURO – Se você vai cair ou continuar de pé, pouco me importa, o que eu não vou mais aturar, são essas cenas ridículas de ciúme. Tá feio isso já.

ISABEL – Sabe por que isso acontece? Porque nós não temos mais diálogo, você tá sempre muito atarefado, sempre muito cansado e eu fico de escanteio, sempre!

Lauro se levanta e se encaminha em direção a porta.

LAURO – Arruma um filho pra cuidar, e esquece essa obsessão em me manter enjaulado. Até porque já está na hora de termos nosso filho. Sexo nunca te faltou.

Lauro sai e bate a porta com força.

ISABEL (convicta) – Eu vou engravidar, custe o que custar!

CORTA PARA:

CENA 20. ABRIGO DE MENORES/ DORMITÓRIO/ INT./ DIA.

Gisela, Eduarda e Alencar estão deitados em suas camas. Gisela está com o pensamento longe.

EDUARDA – Ei, Gisela, o que houve?

GISELA – Não é nada.

ALENCAR – Como nada? Você tá aí a horas sem falar nada, sem se mover. Pisca apenas os olhos.

EDUARDA – Você ficou impressionada com a morte do Miranda?

GISELA – Fiquei foi aliviada. Aquele crápula teve o fim mequetrefe que merecia.

ALENCAR – Então por que tá assim?

GISELA – Quando eu fui lá fora, o Miranda ainda tava vivo, tava falando.

ALENCAR (com curiosidade) – E ele falava o que?

GISELA – Pedia ajuda, dizia que não queria morrer.

EDUARDA – Mas não deu tempo, né?

GISELA – Eu deixei o Miranda agonizando lá. Eu disse que ele iria morrer sim, que iria pro inferno.

EDUARDA (assustada) – Como você pode fazer isso?

GISELA – Ele merecia uma morte pior, foi uma pena ter acontecido só isso com ele. Mas a mágoa, o rancor, o ódio que existe dentro de mim dele e da Lauren, é ferida que não seca nunca.

Eduarda e Alencar ficam perplexos.

CORTA PARA:

CENA 21. MANSÃO CASTILHO/ JARDIM/ EXT./ DIA-NOITE-DIA.

(MÚSICA “DEIXO” – IVETE SANGALO). Transposição do dia para a noite e da noite para o dia várias vezes. Imagens do jardim da mansão, todo decorado para uma enorme festa.

Vários convidados chegam, entre eles: Branca, Santa, Lauro, Isabel e Mouriel. Em seguida Lauren chega vestida de noiva. O juiz de paz casa ela com Romero e os dois saem numa limusine branca.

CORTA PARA:

CENA 22. AP. FRANCO/ SALA/ INT./ DIA.

(FADE OUT TRILHA “DEIXO” – IVETE SANGALO). Franco está com olhos marejados de tanto chorar, está deitado no sofá, assistindo filme, quando o celular toca.

FRANCO (ao cel.) – Alô? Oi senhor Brian Kenedy, tudo bem? (t) Eu tô indo, levando a vida. (t) O que? Trabalhar em Londres? Mas quando? (t) Claro que aceito. Vou arrumar minhas coisas agora mesmo e amanhã estarei aí no seu escritório em São Paulo. Tchau, obrigado!

Franco desliga o celular.

FRANCO – Era isso que eu precisava para esquecer a Lauren. Precisava mesmo sumir do mapa.

CORTA PARA:

CENA 23. CASA DE LAURO/ QUARTO/ INT./ DIA.

Isabel entra no quarto com um envelope em mãos.

ISABEL – Agora é que eu vou saber se posso dar o filho que o Lauro tanto quer.

Isabel abre o envelope, lê e começa a ficar desesperada, em seguida cai num choro profundo.

ISABEL (chorando) – Não, eu não acredito nisso. Isso não pode estar acontecendo. Eu estéril? Não, não pode ser. E agora meu Deus?

LAURO (off) – Isabel, cadê você?

Isabel rapidamente se recompõe, em seguida, guarda o exame dentro de um cofre no guarda-roupa.

ISABEL (tom alto) – Já vou meu amor!

CORTA PARA:

CENA 24. AP. BRANCA/ SALA/ INT./ NOITE.

Branca e Mouriel estão sentadas no sofá conversando.

BRANCA – Tem certeza que não aceita um chazinho?

MOURIEL – Tenho. Eu vim aqui, porque tem uma coisa me intrigando há muito tempo.

BRANCA – Então fala, minha amiga.

MOURIEL – É sobre Gisela.

Branca fica visivelmente desconfortável.

MOURIEL – Onde Gisela está?

BRANCA – Ela está num colégio interno no exterior. A Lauren achou melhor coloca-la lá, porque o estudo é bem melhor.

MOURIEL – Tem certeza, Branca? Por que será que eu acho que você tá me escondendo algo?

BRANCA – Ah minha amiga, você é muito desconfiada. Eu no seu lugar seria mais rilex.

MOURIEL – Olha Branca, eu adorava o Ivan, tinha aquele rapaz como um filho que eu nunca tive. Se eu descobrir que você e a Lauren fizeram alguma sujeira com aquela garota, saibam que eu vou até o inferno, mas acabo com a raça de vocês.

BRANCA – Nossa, você está muito rude hoje.

MOURIEL – Você está avisada.

Mouriel se levanta e vai embora.

BRANCA – Vaca. Só te aturo porque você tem dinheiro.

CORTA PARA:

CENA 25.  AEROPORTO TOM JOBIM/ SAGUÃO/ INT./ DIA.

(MÚSICA “NE ME QUITTE PAS” – MAYSA). Imagens de um vaivém de pessoas embarcando e desembarcando, entre elas, está Lauren e Romero, que logo entram para a sala de embarque.

CORTA PARA:

CENA 26. CÉU/ EXT./ DIA-NOITE.

Imagens de um avião sobrevoando o céu, fazendo a transposição do dia para a noite.

(FADE OUT TRILHA “NE ME QUITTE PAS” – MAYSA).

CORTA PARA:

CENA 27. PARIS/ MARGEM DO RIO SENA/ RUA/ EXT./ DIA.

(MÚSICA “QUELQU’UN M’A DIT” – CARLA BRUNI). Abre em close de Lauren e Romero passeando, ambos muito bem vestidos com roupas de inverno, enquanto a suave neve cai sobre eles.  Eles se deliciam com a paisagem e com o Rio Sena que está ao lado, ao fundo, a Catedral de Notre Dame vai dando espaço a parte lateral do Museu do Louvre, com suas lindas árvores de folhas caducas, que caem suavemente ao chão, enquanto os dois passeiam em clima de romance.

LETREIRO: PARIS, FRANÇA.

CORTA PARA:

CENA 28. PARIS/ HOTEL L’AMOUSIER/ FACHADA/ EXT./ DIA.

Imagens do grandioso hotel, todo em vidro fumê de última geração. Em letras garrafais está o nome: L’AMOUSIER. A frente há um enorme jardim e dois seguranças ao lado da porta de entrada. Segundos depois, Lauren e Romero entram no hotel.

CORTA PARA:

CENA 29. PARIS/ HOTEL L’AMOUSIER/ TERRAÇO/ EXT./ DIA.

Lauren e Romero, logo chegam ao enorme terraço que tem várias mesas, onde inúmeras famílias estão sentadas tomando café e conversando. Eles se sentam em uma mesa bem ao fundo.

(FADE OUT TRILHA).

LAUREN (deslumbrada) – Nossa, eu tô encantada com Paris, que cidade linda.

ROMERO – É mesmo, uma belíssima cidade. Eu sempre passava minhas férias aqui, nessa cidade, nesse hotel. E sempre caminhava a margem do Sena.

LAUREN – Infância feliz. Eu sempre ia pra Duque de Caxias nas minhas férias. Ficava com meu pai no pavilhão da Grande Rio. Não que fosse ruim, não era, mas eu sempre detestei aquele calor e aquela gente bêbada e simpática.

Nesse instante um garçom chega à mesa deles.

Nesse instante um garçom chega à mesa deles.

GARÇOM – Bonne journée , le couple aimerait demander? Lauren fica visivelmente desconfortável. 

ROMERO – Deux cappuccinos et un délicieux tarte aux pommes avec du miel . O garçom anota o pedido e sai. 

LAUREN – Eu não entendo nada de francês. 

ROMERO – Pode confiar, pedi dois cappuccinos e uma maravilhosa torta de maçã. Depois dessa caminhada toda, nós merecemos. Lauren fica cabisbaixa, simula uma falsa tristeza.

ROMERO – O que foi meu amor?

LAUREN (falsa tristeza) – É que eu acabei me lembrando de uma pessoa muito importante pra mim, que ama torta de maçã. Aí, sabe, me bate uma tristeza tão grande.

ROMERO – E quem é essa pessoa?

LAUREN – Tantos acontecimentos, não me deixaram lhe contar algumas partes da minha vida, e acho que devo fazer isso agora.Lauren respira fundo.

LAUREN – Eu fui casada, quer dizer, casada não, eu juntei os trapos com um homem, o Ivan. A gente viveu junto durante uns oito ou nove anos, mas  ele tinha uma amante e acabamos nos separando e ele, infelizmente faleceu após isso, mas o fato é que eu tive uma filha, fruto desse casamento, a Gisela.

ROMERO (surpreso) – Quer dizer que…/

LAUREN (corta) – Exatamente, eu tive uma filha. Com essa coisa de amante, separação e a morte do pai dela, eu decidi que era melhor que a Gisela crescesse longe disto. Por isso eu a mandei a um colégio interno em Portugal. Sabe, Romero, é muito difícil criar uma filha, às vezes eu não tenho dinheiro para comprar um bife, mas pago, religiosamente, todo mês o colégio e os confortos da minha filha. Lauren força um choro e Romero, com olhar de piedade, a abraça.

LAUREN – É difícil viver longe dela, mas faz-se necessária essa separação. É para o bem da Gisela.Lauren continua com o choro.

ROMERO (levantando-se) – Vou buscar uma água pra você. É emoção demais.Romero sai em direção ao bar do hotel.

LAUREN (debochando) – Num tô falando? O homem é um banana. Gosto assim, homem burro é que é bom.

CORTA PARA:CENA 30.  NOVA ALIANÇA/ PÓRTICO/ EXT./ NOITE-DIA.

Imagens do portal de entrada da cidade. Transposição da noite para o dia.

LETREIRO: “DIAS DEPOIS…”

CORTA PARA:CENA 31. AP. BRANCA/ SALA/ INT./ DIA.

Branca está sentada no sofá lixando as unhas, quando a campainha toca. Ela se levanta e vai atender.

BRANCA (surpresa) – Lauren?Lauren adentra a sala com roupas extremamente chiques e com inúmeras sacolas.

LAUREN – Trouxe presentinhos para a senhora, para o Lauro e para a mala sem alça da Isabel. Esses são todos seus. Perfumes, cremes, roupas e até algumas joias.

BRANCA (encantada) – Tudo isso pra mim?

LAUREN – Tudinho.

BRANCA – Agora sim eu tô vendo que essa sua nova vida é boa mesmo.

LAUREN – A senhora ainda não viu nada, mamãe. Tem muito mais coisa por vir. Já vi que o Romero é um idiota de marca maior, ludibriar aquele ser, é a coisa mais fácil que se pode existir.

BRANCA – Cuidado, autoconfiança pode ser um perigo.

LAUREN – Eu agora sou Lauren Fischer Castilho de Almeida, meu amor. Não existe Deus, não existe força maior ou o diabo a quatro que me vença.Branca olha Lauren, com certo pânico.

CORTA PARA:

CENA 32. SÃO PAULO/ PONTOS TURÍSTICOS/ EXT./ DIA-NOITE-DIA.

(MÚSICA “GARGANTA” – ANA CAROLINA).

Transposição do dia para a noite e da noite para do dia várias vezes.

LETREIRO: “OITO ANOS DEPOIS!”.

CORTA PARA:CENA 33. SÃO PAULO/ ABRIGO DE MENORES/ DIRETORIA/ INT./ DIA.

Gisela (18 anos, cabelo castanho e longo, magra, muito bonita), Alencar (18 anos, cabelos pretos e levemente bagunçados, forte) e Eduarda (18 anos, cabelos pretos cacheados, baixa, branca e magra), estão sentados, de frente para a diretora (mulher alta, loura, cabelos presos num rabo-de-cavalo, magra, trajando terninho de alfaiataria em tom pastel) do abrigo.

DIRETORA – Hoje é um dia muito especial para vocês três. Após tantos anos, tantas idas e vindas sem fim. Sei que aqui tiveram mais sofrimento do que alegrias, é a lei natural de um abrigo, mas foi a carência de afeto familiar e o exílio social que fizeram de vocês três amigos de verdade. É do deserto mais seco, que nasce a mais bela flor. Assim aconteceu com vocês.

GISELA – Eu vi essa vida minha virar de ponta cabeça. Fui do luxo ao lixo. Hoje eu sei que não existe fundo do poço, que sempre podemos dar mais uma cavadinha e estar mais na lama.

DIRETORA – O fato é que hoje vocês ganharam a liberdade, a carta de alforria. O que era distante e fictício, hoje se torna real. Vocês podem arrumar as coisas de vocês e sair a qualquer momento. Desejo-lhes toda a sorte do mundo.

ALENCAR – Sorte? Eu acho que a gente necessita de um pouco mais do que sorte pra encarar a realidade. Enjaulados há mais de oito anos, a gente necessita é de um kit de sobrevivências a esse jogo chamado VIDA!

DIRETORA – Que tenham sorte, que rendam bons frutos.Todos se levantam e se encaminham em direção à porta de saída.

DIRETORA – Gisela.Gisela vira-se para ela.

DIRETORA – Posso falar um minutinho com você?Alencar e Eduarda saem da sala e fecham a porta.

GISELA – Fiz algo de errado?

DIRETORA – Durante todos esses anos em que você esteve aqui, uma pessoa, que não quis se identificar, te deixava uma quantia em dinheiro. Todo mês esse dinheiro era depositado numa conta em seu nome, a qual eu guardei. Acho que chegou o momento de você usufruir desse dinheiro, não acha?

GISELA (surpresa) – Dinheiro? Mas como assim?

DIRETORA – Eu não posso falar quem foi, mas te garanto que é uma alma do bem e que te ama muito. Aproveita esse dinheiro e muda o seu destino. Vai ser feliz.Gisela olha emocionada para a diretora.

CORTA PARA:

CENA 34. SÃO PAULO/ ABRIGO/ PORTÃO DE SAÍDA/ EXT./ DIA.

(MÚSICA “POR ENQUANTO” – CASSIA ELLER).

Imagens de Alencar, Eduarda e Gisela, saindo do abrigo com uma mochila nas costas. Eles atravessam a avenida e embarcam em um ônibus.

CORTA PARA:

CENA 35. NOVA ALIANÇA/ MANSÃO CASTILHO/ SALA DE ESTAR/ INT./ DIA.Branca e Lauren estão sentadas no sofá, tomando chá e conversando.

BRANCA – Se eu fosse você, faria uma segunda lua de mel. Iria para o Canadá, lá é lindo demais.

LAUREN – A senhora, por algum acaso, já foi ao Canadá?

BRANCA – O mais longe que fui, foi numa romaria apertada, até Aparecida do Norte, meu bem.

LAUREN – E como é que a senhora me confirma que o Canadá é lindo?

BRANCA – Minha filha existe uma coisa chamada fotografia, criada em 1851, meu bem. Eu conheço o Canadá de fotos de revistas, panfletos de agências de turismo e por aí vai.

LAUREN – Mas segunda viagem o Romero não vai querer fazer. Agora tem a peste da Ana Clara pra atrapalhar o andamento da minha vida.Nesse instante, uma menina, oito anos, levemente gordinha, cabelos lisos, e rosto angelical entra em casa, de mochila e com uniforme escolar.

BRANCA – Por falar na coisinha, olha ela aí. Como foi a escola, Ana Clara?Lauren bufa de raiva.Ana Clara larga a mochila no chão e corre para abraçar Branca.

ANA CLARA (feliz) – Vó, que bom que a senhora veio.Branca se levanta, com cara de poucos amigos e se desvencilha de Ana Clara.

BRANCA – Em primeiro lugar Ana Clara, nunca me chame de vó, pra você é dona Branca, tia Branca, ou simplesmente Branca. E em segundo lugar, você tá suada e eu acabei de passar meu perfume importado, portanto, faça favor de manter a distância.

LAUREN – Você é bem petulante né, Ana Clara. Não viu que a mamãe e eu estávamos conversando? Quantas vezes eu vou ter que repetir que não quero que você me atrapalhe?

ANA CLARA (CABISBAIXA) – Mas é que a senhora tá sempre ocupada e nunca tem tempo pra mim. Não me leva pra passear, nem ir a casa da vovó Branca eu vou.

BRANCA – Eu não sou sua avó. Já disse isso coisinha.

LAUREN – Eu sou uma mulher muito ocupada. Infelizmente não tenho tempo pra você. Mas você tem brinquedo, tem babá, tem escola boa. Não tem do que reclamar. Agora pega essa merda dessa mochila e some da minha frente, antes que eu pegue o cinto e te dê uma boa dumas lapadas. Ana Clara ameaça um choro, pega sua mochila e sobe as escadas correndo.

LAUREN – A senhora tá vendo né? Eu tô rica, mas Jesus já me castigou com um marido burro e com uma filha peste.

BRANCA – Pelo dinheiro meu amor. Pensa que é tudo pela fortuna desse babaca do Romero. Respira, toma uma taça de champanhe e torra um cartão de crédito, que passa.

CORTA PARA:

CENA 36. SÃO PAULO/ AVENIDA PAULISTA/ EXT./ DIA.

Imagens aéreas da Avenida Paulista. Corta para  imagens planas com inúmeras pessoas passando pelo local, imagens do comércio e do vai e vem de carros. Entre as centenas de pessoas que passam pelo local, está Alencar e Eduarda tentam acompanhar Gisela, que está andando na frente deles, apressadamente.

ALENCAR (gritando) – Gisela, você vai onde com essa pressa toda?

GISELA – Vocês são umas lesmas. Andem depressa, estamos quase chegando.

EDUARDA – Mas chegando onde?Gisela continua andando e entra num beco deserto e bastante abandonado.

CORTA PARA:

CENA 37. AVENIDA PAULISTA/ SALA ABANDONADA/ INT./ DIA.

Gisela entra em uma sala escura, suja e totalmente deserta. De repente um homem barbudo, velho e desdentado aparece. Ela se assusta um pouco, mas se contém. Os dois ficam se olhando. Pouco depois, Eduarda e Alencar aparecem.

EDUARDA (receosa) – O que você veio fazer aqui, Gisela?

GISELA (ao velho) – Tá pronta?

VELHO – Eu nunca falhei moça. Tá pronta sim, mas cadê o combinado?Gisela abre sua mochila e retira um bolo enorme de notas de cinquenta reais e entrega ao velho.

GISELA – Agora cadê?Alencar e Eduarda ficam assustados. O velho retira um RG e entrega a Gisela.Close no RG com a foto de Gisela e o nome: TARA BUENO. Ela pega o documento e sai junto com Eduarda e Alencar.

CORTA PARA:

CENA 38. AVENIDA PAULISTA/ EXT./ DIA.Gisela está sentada em um banco ao lado de Eduarda e Alencar.

ALENCAR – O que aconteceu agora a pouco naquele lugar? Não entendi nada.

EDUARDA – Onde você conseguiu grana? Aliás, como você entrou num banco e consegui sacar um dinheiro?

GISELA – Eu vou abrir o jogo.

ALENCAR – Acho bom, minha querida!

GISELA (a Alencar) – Você não acha nada. Fica quieto, senão eu sumo no mundo e ninguém mais ouve falar de Gisela Godoy Fischer.Eduarda e Alencar se olham e ficam calados.

GISELA – Há alguns anos, eu já tinha em mente que mudaria de nome pra poder sumir, me vingar, ou simplesmente esquecer esse meu passado. O fato é que eu tinha acesso a um dinheiro do Miranda, e aos poucos eu conseguia catar uns poucos reais. O fato é que nas aulas de informática, eu fui procurando e achei quem fazia um RG falso e quanto era. Contatei eles há uns meses atrás, mandei uma foto minha e pronto, fizeram. Eu escolhi o nome Tara Bueno.

EDUARDA – Tá, mas e o dinheiro do banco?

GISELA – Aquela grana, a diretora me disse hoje que foi um tutor que me deu. Depositou esses anos todos em que estive naquele lugar. Não sei quem é a alma boa, mas sei que esse dinheiro servirá para eu usufruir bem. Podem apostar!

CORTA PARA:

CENA 39. AP. BRANCA/ SALA/ INT./ DIA.

Branca está eufórica, andando de um lado para o outro, até que a campainha toca e ela corre para atender

.LAUREN (entrando) – Não entendi o motivo de tanta urgência, mamãe. Acabamos de nos ver.

BRANCA – O motivo é seríssimo.

LAUREN – Então fala de uma vez.

BRANCA (assustada) – A Maracutaia sai hoje da cadeia. A víbora ganhou a condicional.

LAUREN (assustada/ surpresa) – O que?

CORTA PARA:

CENA 40. PENITÊNCIÁRIA/ FACHADA/ EXT./ DIA.

Imagens do portão de saída do local.

MARACUTAIA (off.) – Eu esperei muito por esse dia. Anos trancafiada por um crime que eu não cometi. Esse é mais um dos tantos erros que o destino coloca na vida da gente. Barulho de muitas palmas.

CORTA PARA:

CENA 41. PENITENCIÁRIA/ CORREDOR/ INT./ DIA.

Maracutaia vem caminhando pelo corredor entre as celas, com uma trouxa de roupa nas mãos, enquanto é aplaudida por todas as outras detentas. Ela caminha cabisbaixa, até chegar ao final do corredor e dar de cara com uma carcereira.

CARCEREIRA – Tá pronta?

MARACUTAIA (convicta) – Pronta desde o dia em que nasci. Elas continuam caminhando em direção à saída.

CORTA PARA:

CENA 42. PENITENCIÁRIA/ PORTÃO DE SAÍDA/ EXT./ DIA.

O portão se abre e Maracutaia sai com uma trouxinha nas mãos, vai caminhando, até que se depara com Lauren a sua frente. Maracutaia olha assustada para ela.

LAUREN – Tá lembrada de mim? As duas se olham tensas.

 

FIM CAP. 02

 

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