Diva

Diva – Capítulo 12

(Ao Meio-Dia…)

 

“Pascualita certificou-se de chamar Charlote à mesa, para almoçar naquela ensolarada tarde de terça-feira, tipicamente paulistana. Lá, Billy já devorava faminto e voraz a um prato repleto de empanados de frango, servindo-se também de um refresco gasoso de uma coloração negra castanha. Seu gosto adocicado de xarope e pneu de caminhão queimado a mentol, cuja felicidade prometida nunca fora realmente resoluta, quem dirá verdadeira. Já ao acento de Charlote, uma bandeja de prata já havia sido devidamente posicionada. Pascualita mantinha-se rija em sua postura de irrefutável indiferença quanto ao filho e a cliente, que também esboçava notável indignação.”

 

CHARLOTE : (pensa) Jogando a culpa da obesidade e da infância perdida para o bullying e a depressão pra cima do próprio filho. Isso é que é não ter coração! Megera! Cruel! Insensível! Isso é que você é!

 

PASCUALITA : Siéntese Charlotte!

 

CHARLOTE : Sim senhora.

 

“Ao sentar-se e verificar o conteúdo de sua bandeja, Charlote nada se surpreendeu ao lá encontrar apenas dois brócolis flutuantes sobre um prato com uma sopa tão rasa que poderia ser contada em mililitros. Ao sorver as primeiras, tão logo as últimas colheres do caldo, sentiu-se aliviada ao saber que aqueles seriam os últimos minutos em que se sentiria vazia. Após o termino daquela tão enfadonha refeição, Pascualita fez um importante comunicado a Charlote.”

 

PASCUALITA : Minha querida, veo que cada día avanza más y más. Ya que incluye la adquisición de una mejor manera. Bueno, aunque no es un progreso muy claro, podemos decir que es un buen comienzo! (Minha querida, vejo que a cada dia que passa está progredindo cada vez mais. Já está adquirindo inclusive uma forma melhor. Bem, apesar de não ser um progresso muito evidente, já podemos dizer que é um bom começo!)

 

CHARLOTE : (pensa) Um esqueleto de laboratório chega a ter mais carne do que eu, e você vem me dizer que é apenas o começo?! Você bem que poderia ter enfiado aquela sopa de brócolis, sabe aonde…

 

PASCUALITA : Ahora, puedo decir que estoy dispuesta a dejar de lado algunas de las privaciones impuestas a usted, por ejemplo, ahora se puede superar la puerta de la sala de estar y tendrá plena libertad de entrar y salir cuando lo desee! (Agora, posso dizer que me sinto disposta a anular algumas das privações que impus a você, como por exemplo, agora você poderá ultrapassar a porta da sala de estar e terá total liberdade de ir e vir quando bem entender!)

 

CHARLOTE : É mesmo?

 

PASCUALITA : Sí, sí. Pero con una condición.

 

“Pascualita apanha um cinto de dentro de sua bolsa e o entrega nas mãos de Charlote.”

 

PASCUALITA : Veste esto!

 

CHARLOTE : Mas por quê?

 

PASCUALITA : Cállate. Mandé desgaste! Vamos, poner el cinturón!

 

CHARLOTE : Ta bom! Ta bom, to vestindo!

 

“Charlote prende o cinto ao cós de sua calça sem ao menos imaginar a armação que escondia aquele singelo acessório.”

 

PASCUALITA : Yo te mostraré lo que hace! Observe por favor. (Irei demonstrar a você o que isso faz! Observe.)

 

“Pascualita retira uma barra de chocolate do bolso da calça.”

 

PASCUALITA : Tiente pegar!

 

“Charlote tenta apanhar o chocolate das mãos de Pascualita, mas ao encostá-lo recebe uma descarga elétrica vinda da fivela do cinto.”

 

CHARLOTE : (grita) Ai, puta que pariu!

 

PASCUALITA : Viste! Este cinturón está equipado con este dispositivo. Captura cuando se aproxima a algo que es muy calórico y exuda un leve choque a su sistema nervioso para evitar que hagas algún deslize.

 

CHARLOTE : Um leve choque? Querida, essa porra doeu no meu âmago! O meu útero está latejando, isso pode ter me deixado estéril.

 

PASCUALITA : Eso significa que está funcionando! Ahora vá! Ah, y antes de que me olvide, no trate de desabrochar este cinturón, porque si no se fríe usted! Sólo yo sé cómo desbloquearlo y lo haré sólo cuando llega la noche. (Isso significa que está funcionando! Agora, vá! Ah, e antes que eu me esqueça, não tente desafivelar esse cinto, porque se não ele frita você! Apenas eu sei como destravá-lo e só o farei quando a noite chegar.)

 

“Dora e Ricky descem as escadas.”

 

DORA : Meninas, estamos saindo! Vamos passar tarde fora.

 

PASCUALITA : Puede dejar Dora, su casa y su sobrina están en buenas manos.

 

RICKY : Vamos logo então.

 

“Dora e Ricky deixam o condomínio.”

 

CHARLOTE : (pensa) Uma pena que você se esqueceu de criar um dispositivo anti farmácia, Pás!

 

“Charlote solta uma gargalhada.”

 

PASCUALITA : Qué es tan gracioso? Vamonos, sal de aqui. (Qual é a graça? Vamos, de o fora daqui!)

 

(Enquanto Isso, no Apartamento de Galdéria…)

 

“Guto rouba um beijo de Galdéria, que mesmo tendo gostado e ainda contribuído para que o carinho se prolongasse, logo recuou atônita.”

 

GALDÉRIA : Meu Deus! O que foi isso?

 

GUTO : Galdéria, eu sempre quis que soubesse disso. O que sinto por você sempre foi muito além dessa amizade fraternal a qual apenas você enxerga. Eu estou apaixonado por você! Eu te Amo!

 

(Minutos mais Tarde, na Casa de Beto…)

 

“Dora e Ricky chegam à casa de Beto, e pela empregada são convidados a sentarem-se nas confortáveis poltronas de sua sala de visitas onde também são servidos com biscoitos e uma xícara de chá de frutas vermelhas fervilhante. Enquanto aguardavam, ambos estonteavam-se com a beleza da decoração da casa do ator. Fotos suas e de prováveis affaires se se distribuíam por todo o cômodo, revelando um certo fetichismo vindo de sua parte, que tornavam o ambiente um misto de uma galeria de arte com um palácio digno dos contos de fadas.”

 

BETO : Dora!! Meu Deus, rufem os tambores, pois estou bege! Você, aqui em minha humilde choupana?!

 

DORA : Se você chama isso de choupana, o que dirá da minha casa que não dá, sei lá, nem um terço disso tudo.

 

“Dora e Beto trocam beijinhos.”

 

BETO : Imagina! Você, vivendo só na vagabundagem chega a estar bem melhor do que eu que tenho que gravar todo dia, querida!

 

DORA : Você devia tirar umas férias. Digo isso, devido a dez anos de experiência! Sei lá, descansar a imagem faz bem! Refrigera a alma.

 

BETO : Quem sabe! Talvez. Mas me diga, a que devo a honra?

 

DORA : Você se esqueceu de que havíamos combinado de ir à matinê de cinema, hoje às duas?

 

BETO : É mesmo! Como pude ter me esquecido?! Olha, eu vou subir trocar de roupa rapidinho e vocês me esperam aqui!

 

“Beto subia as escadas quando o seu olhar se encontrou com o de Ricky, que retribui com um sorriso retraído.”

 

(Minutos Depois, no Carro de Beto…)

 

“Beto dirigia seu novo Camaro Branco alternando os olhares entre Dora no banco do passageiro, a estrada pouco movimentada, e o rosto tão perfeitamente delineado de Ricky através do espelho de teto e do retrovisor.”

 

BETO : Então quer dizer que mesmo depois desses quatro meses vivendo apenas de água e luz solar, sua sobrinha ainda não entregou os pontos?

 

DORA : Pois é. Mas ela não perde por esperar. Não. Claro que não! Ainda mais agora que pedi a Pascualita para dar uma maior atenção a ela reforçando ainda mais o teor dessa dieta. Duvido que a Charlote vá suportar. Isso se suportar, é claro.

 

“Beto focaliza seu olhar em Ricky.”

 

BETO : E você! Ainda não fomos apresentados, não é mesmo?

 

RICKY : É…eu…

 

DORA : (interrompe) Ricky, minha escrava de luxo!

 

BETO : Hum. Bonito desse jeito se trabalhasse pra mim, seria meu escravo sexual!

 

DORA : (ri)

 

“Ricky fica todo enrubescido.”

 

(Enquanto Isso, nos Portões do Condomínio Paulo Neves…)

 

“Pasquale tem um breve lapso de sua conversa com Dora dias atrás.”

 

FLASHBACK…

 

DORA : As pessoas que passam por aqui não veem a mesma coisa. Elas veem é um pobre coitado que podia estar cantando no programa do Castor Jr, mas que ao invés disso está aí na rua como um lixo qualquer totalmente passivo ao destino e avesso ao próprio talento, que poderia te tirar dessa lama! Sabe, eu esperava mais de você!

 

FIM DO FLASHBACK…

 

“Nisso lembrou-se também de quando fora pela primeira vez a Berlin há exatos 25 anos. Estava fazendo um intercâmbio através de uma faculdade de música. E foi lá que pela primeira vez se apresentou a um grande público num recital, onde faria um dueto ao lado de Bárbara Stefan, a mulher mais encantadora que já conhecera.”

 

FLASHBACK…

 

(Berlin…1990…Opera de Berlin…)

 

“O público estava lotado, Pasquale sentia seu sangue ferver ao passo de que seu coração descompassado também não via a hora de se encontrar com Bárbara no Palco. Hoje, faria o pedido. Se declararia a ela perante toda a nata da sociedade alemã ali presente. Mas então passou-se meia hora, uma, duas horas e nada dela chegar. Nisso o diretor do espetáculo pediu para que Pasquale começasse sozinho. Ele adentra o Palco, sendo aclamado pelas palmas de seu público que tão logo cessaram e ele começou a cantar: Eu Te Amo do Chico Buarque.”

 

PASQUALE : (canta) Ah, se já perdemos a noção da hora. Se juntos já jogamos tudo fora, Me conta agora como hei de partir. Ah, se ao te conhecer dei pra sonhar fiz tantos desvarios, rompi com o mundo, queimei meus navios. Me diz pra onde é que inda posso ir. Se nós, nas travessuras das noites eternas já confundimos tanto as nossas pernas, diz com que pernas eu devo seguir…

 

“Quando Pasquale já estava no final da música, notou que o diretor caminhava desesperado de um lado para o outro nos bastidores. Foi quando num ato impensado e de grande bravura alguém entrou correndo no auditório e em alemão gritou: ela se suicidou!”

 

FIM DO FLASHBACK…

 

“Fora essa razão de não querer nunca mais usufruir de seu dom, mesmo quando mais precisou após ter perdido tudo. Desde a morte de Bárbara, nunca mais cantou. Suas breves apresentações ao ar livre, eram-lhe apenas um modo de obter alguns trocados dos transeuntes. Mas nunca mais se atreveria a entrar num palco, não queria desenterrar esse fantasma de seu passado.”

 

(Naquela Noite, na Casa de Dora…)

 

“Beto acaba de deixar Dora e Ricky na porta de sua casa e se despede agradecendo-lhes pela tarde tão agradável. Os dois entram na casa e lá encontram na Sala de Estar, a esperar furiosamente, ninguém mais ninguém menos que Geny a cabeleireira.”

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