O Último Ano

Capítulo 4 – O Último Ano

O ÚLTIMO ANO

O DIEGO SECRETO.

Porque ele fez aquilo? Era só o que eu me perguntava a todo instante sem trégua. A resposta era o que Eduarda e todos falavam. Diego era um moleque sem coração. Ele tinha prazer em ver os outros na pior. Ele poderia ficar feliz, porque eu estava muito, muito, muito mal. Decepcionado. Triste. Decidido até a pedir minha mãe para me tirar do Instituto Daniel de La Touche e me mandar para casa dos meus avós em Brasília. Antes eu queria conhecer Diego. Agora queria esquecer mais que tudo!… Que ódio de mim. Eu queria tudo aquilo, mas lembrava no inocente beijo na minha casa. Algo não batia. Havia algo errado. Eu mesmo relutava em acreditar. Mas eu estava ferido, machucado. Queria sim resposta, mas tinha medo de confirmar o que tanto falavam… Afinal de contas quem era realmente Diego e com que sentimento eu estava lidando?”

(Trecho do diário de Elvis Braga)

Pátio do Instituto de Daniel de La Touche. Elvis está chorando sendo consolado por Eduarda.

EDUARDA: Amigo, eu sei que é difícil, mas você estava avisado. Sabia muito bem que espécie de gente é esse Diego.

ELVIS: Eu fui um bobo mesmo. Minha vontade é ir embora. Vou pedir minha mãe pra me mandar pra Brasília hoje mesmo.

EDUARDA: Só por causa disso? Amigo, não acredito que você vai agir assim só por causa da babaquice daquele idiota? Amigo você é lindo, inteligente, educado enfim… Isso deve ser só recalque desse garoto mal amado.

ELVIS: Sim, mas é do lindo, inteligente e educado que eles vão ficar zuando agora.

EDUARDA: Aqui na escola tem um monte de outros garotos gays também. Tem hora que a turma pega pesado, mas é você quem tem que calar a boca deles. E não o contrário! Você não deve fugir deles. O preconceito existe infelizmente, mas você tem que superar. Se gay ou não, mostre que você é o melhor e pronto!

Diego se aproxima.

DIEGO: Elvis eu não fiz aquilo!

EDUARDA: Ah garoto! Você já conseguiu o que queria. A turma amou o espetáculo que você armou. Vai lá receber os seus aplausos vai. Não precisa vir dar um showzinho particular para nós.

DIEGO: Eu estou falando sério. Eu não fiz aquilo. Eu não seria capaz de…

EDUARDA: Ah, seria! E como seria capaz Diego! Você já fez coisa pior aqui nessa escola. Olha quer saber, você já deve ter percebido que Elvis não quer falar com você. Se manca! Vamos sair daqui Elvis.

Elvis e Eduarda saem. João Pedro se aproxima de Diego.

JOÃO PEDRO: Cara eu não estou te reconhecendo. O combinado era ferrar o novato, certo? Pronto já fizemos.

DIEGO: Você fez!

JOÃO PEDRO: Não entendo essa tua preocupação aí. Todo nervoso por conta de uma brincadeira.

DIEGO: Cara ontem ele e a mãe dele foram super legais comigo. Ele é um cara bacana. Eu não quero marcar feio com ele.

JOÃO PEDRO: Você mesmo falou que ele era metido, pela saco e tal…

DIEGO: Eu estava enganado. A gente conversou muito ontem e ele me deu uns conselhos bacanas sabe?

JOÃO PEDRO: Sei. Mas agora tá feito e a escola já sabe que ele é veado.

DIEGO: Por tua culpa. Deveria ter me falado antes. Idiota!

Diego sai com raiva. João Pedro fica sem entender.

Elvis volta para a sala de aula com Eduarda. Por onde passou ouviu risos e piadinhas. A campainha tocou. Mas ao invés de professor, quem adentrou a sala foi diretor Heitor. Os alunos todos foram entrando e sentando.

HEITOR: Bom, eu já soube da brincadeirinha de péssimo gosto que fizeram com aluno Elvis há pouco. Também fui informado de um responsável. Por favor, quero que o responsável mesmo se levante diante de todos.

A sala mergulha por completo em silencio. Todos os olhares se voltam para Diego.

HEITOR: Eu vou repetir. Talvez o culpado não tenha ouvido bem. Por favor, quero que o responsável se levante… Agora.

Então de repente João Pedro se levanta.

JOÃO PEDRO: Foi mal aí diretor.

HEITOR: João Pedro?

Alguém grita.

VOZ: Ele quer encobrir o Diego!

JOÃO PEDRO: Vai tomar no…

HEITOR: João Pedro! Pra minha sala agora.

JOÃO PEDRO: É o senhor quem manda.

HEITOR: Acompanhe-me também Elvis.

Os três caminham para a diretoria. No trajeto, aproveitando que Heitor caminha mais adiante, Elvis se vira para João Pedro.

ELVIS: Foi você mesmo?

JOÃO PEDRO: Não, claro que não. Eu me coloquei no lugar do verdadeiro culpado porque queria conhecer a sala do diretor e pegar uma suspensão. Idiota.

Na sala do diretor…

HEITOR: Então você assume que fez essa brincadeira com seu colega Elvis?

JOÃO PEDRO: Sim assumo.

HEITOR: E porque?

JOÃO PEDRO: Eu só queria sacanear ele.

HEITOR: Dessa maneira? Expondo ele dessa forma?

JOÃO PEDRO: Diretor essa não era minha intenção. Eu até planejei outra coisa, mas quando abri a mochila dele para pegar uma folha do caderno…

HEITOR: Porque queria uma folha do caderno dele?

JOÃO PEDRO: Eu iria fazer uma carta anônima e incriminar ele. Na verdade a ideia de ferrar ele foi do Diego. Mas eu iria fazer tudo.

HEITOR: Ideia do Diego certo?

JOÃO PEDRO: Não, ele deu uma ideia ontem por causa de uma treta que aconteceu entre ele dois. Mas eu iria fazer tudo. Diego nem iria ajudar. Quando fui pegar uma folha de caderno dele e vi a declaração pro tal Pietro eu não me controlei e fiz aquilo no quadro. Mas o Diego nem sabia disso.

HEITOR: Você está falando a verdade?

JOÃO PEDRO: Impressionantemente sim.

HEITOR: Mas o que você fez foi muito feio. Além de violar a mochila de Elvis, ainda expos a intimidade do garoto?

ELVIS: Eu poderia processar sabia?

JOÃO PEDRO: Cara só foi uma brincadeira.

ELVIS: Só não vou fazer isso porque não pretendo que minha mãe saiba do ocorrido. Se ela soubesse seriam outros quinhentos. Você teria sérios problemas. Eu nem me importo que a escola saiba se eu sou gay ou não, o que me deixou chateado é que você mexeu na memória de uma pessoa que já faleceu.

JOÃO PEDRO: Desculpa. Mas com eu iria saber?

ELVIS: Não precisava saber, assim como não precisava fazer essa brincadeira ridícula! Era só ter me respeitado e pronto!

HEITOR: Elvis tem toda a razão. Eu não sei o que dá na cabeça de vocês. Ontem foi Diego chamando um colega de macaco, agora é você fazendo a escola rir da orientação sexual de Elvis. Acho que basta né? Vamos respeitar aos outros que ninguém terá problema no mundo.

JOÃO PEDRO: Já pedi desculpa. Quer que eu peça novamente?

HEITOR: Acho que Elvis já ouviu seu pedido.

ELVIS: Quero que ele seja devidamente punido senhor diretor.

HEITOR: Claro que vai. Diego já está pagando pelo que fez. Agora é sua vez João Pedro.

JOÃO PEDRO: Ah meu Deus, diga lá.

HEITOR: Faz um tempo que a grama do campo de futebol não tem sido aparada!

JOÃO PEDRO: O campo?!

HEITOR: O próprio!

JOÃO PEDRO: Mas aquilo é enorme!

HEITOR: Enorme também é a indenização que você pode acabar pagando para Elvis caso ele abra um processo.

JOÃO PEDRO: Quando começo?

João Pedro começaria o trabalho de aparar a grama do campo de futebol no dia seguinte. Passaram os dois últimos tempos de aula e por fim era hora de ir para casa. Diego, no entanto ficou. Se dirigiu para  o muro da quadra e voltou a pintar. A cada cinco minutos, Diego olhava ao redor esperando que Elvis pudesse aparecer. Mas Elvis não apareceu. Ele ficou estranhamente triste e nem sabia ao certo o porque daquele sentimento.

DIEGO: Eu só estrago as coisas! É só isso que sei fazer!

Diego então se lembrou dos conselhos de Elvis. De repente ele também lembrou algo que fez pela manhã. Ele havia baixado a música Macaé de Clarice Falcão. Ele colocou os fones de ouvidos e começou a escutar a canção.

“Eu queria tanto que você não fugisse de mim. Mas se fosse eu, eu fugia.”

Nesse exato instante Elvis chegava a casa ouvindo a mesma música. Ele também estava lembrando-se de Diego. E mais cedo foi difícil resistir o desejo de ir vê-lo pintando o muro. Assim que entrou no seu quarto, Elvis ficou olhando para cama por alguns instantes… Era ali que ele estava na noite anterior. Elvis sentiu uma espécie de saudade. Mas ainda relutava em acreditar que aquilo não tinha sido armação de Diego.

Elvis resolve ligar para Eduarda.

ELVIS: Oi amiga?

EDUARDA: Oi Elvis.

ELVIS: Tudo bem?

EDUARDA: Sim. Está tudo bem sim. E com você?

ELVIS: Nem um pouco. Estou tão mal com tudo que aconteceu hoje na escola.

EDUARDA: Eu sei. Não é pra menos né amigo? Mas calma tudo isso vai passar. Na verdade já passou!

ELVIS: Só tem uma coisa que não passa. E é isso que me preocupa.

EDUARDA: O que?

ELVIS: Eu estou desconfiando de uma coisa.

EDUARDA: De que?

ELVIS: Eu estou gostando do Diego.

EDUARDA: Isso não é um trote não né?

Elvis ri um pouco.

ELVIS: Não Duda. É verdade. Eu nem sei explicar, mas Diego mexe comigo.

EDUARDA: Para falar a verdade eu já sabia. Eu vi na lanchonete os seus olhinhos brilhando quando falou dele.

ELVIS: Eu saquei que você percebeu. Mas eu não queria admitir. Porque eu nem tinha certeza. Era muito cedo para falar alguma coisa.

EDUARDA: E porque você teria certeza logo agora depois de tudo que aconteceu hoje na escola?

ELVIS: Porque eu continuo sentindo algo muito forte por ele. No momento eu senti ódio. Mas depois que a poeira baixou eu percebi que ainda sinto um carinho por ele. Até porque agora já sei que não foi ele quem fez aquilo…

EDUARDA: Num sei não. João Pedro e Diego são unha e carne. Apostaria que João Pedro pegou a culpa para não complicar Diego na escola. Você sabe no dia anterior ele já havia aprontado com Jeremias.

ELVIS: Mas João Pedro me pareceu tão sincero. E além do mais ele se submeteu ao castigo e vai aparar a grama do campo por uma semana. Ele faria isso só para não incriminar o Diego?

EDUARDA: Não sei amigo. Só acho que você deve consultar bem esse coraçãozinho aí. Diego não é homem para você!

ELVIS: Pietro também não era.

EDUARDA: Pietro era assim igual a Diego?

ELVIS: Talvez pior! Pietro se metia com gente perigosa, era rebelde, não se dava bem com a família. Depois que a gente começou a namorar ele mudou muito. Da água para o vinho, praticamente. A família dele foi muito grata a mim pelo que fiz pelo Pietro. Minha mãe no começo não aprovava porque dizia o mesmo que você está dizendo do Diego. Mas com o tempo ela viu a mesma coisa que eu: Ele só era alguém que precisava de carinho e atenção. Minha mãe passou a tratar ele como um filho… Mas pouco mais de um ano depois ele descobriu a doença e ela foi cruel tirando Pietro da gente rapidinho.

Elvis fica coma voz esganiçada.

EDUARDA: Que triste. Mas então, você gosta de um menino complicado e problemático né?

ELVIS: Digamos que eu não sei.

Eles riem. A conversa fica descontraída. Os dois passam quase duas horas na linha até que Elvis cochila na cama do quarto.

Enquanto isso nos arredores do condomínio… Dona Elis voltava para casa de carro quando parou em um sinal. Ao olhar para o lado, pela janela, ela reconhece um jovem que vai caminhando pela calçada. Ela desce o vidro do carro.

ELIS: Diego?

Diego logo a reconhece. Era a mãe de Elvis.

ELIS: Para onde você está indo, meu filho?

DIEGO: Eu estou indo na sua casa.

ELIS: Pois entra no carro. Que sorte sua não?

Diego entra no carro.

ELIS: Está indo somente visitar ele ou vão fazer algum trabalho?

DIEGO: Só visitar mesmo.

ELIS: Mas vocês já não se viram na escola hoje?

Diego fica calado.

ELIS: Posso fazer uma pergunta sem te ofender?

DIEGO: Pode.

ELIS: Vocês dois estão tendo alguma coisa?

DIEGO: Como assim?

ELIS: Se estão ficando ou namorando, sei la.

DIEGO: Não dona Elis!

ELIS: Hum. Olha lá hein. Não vão ficar me escondendo as coisas. Eu quero saber de tudo viu!

DIEGO: Espera um pouco… A senhora sabe que o Elvis é gay?

ELIS: Claro. Ele é meu filho! Foi ele que te contou?

DIEGO: Não exatamente. Mas acabei descobrindo.

ELIS: Algum problema?

DIEGO: Não tia! Problema nenhum. Eu já achei ele super legal sem saber que ele era gay e não vai mudar de nada.

ELIS: Que bom. Tem certeza que não estão me escondendo nada?

DIEGO: Absoluta certeza tia.

ELIS: Então vocês não estão namorando?

DIEGO: Não.

ELIS: Que pena. Fariam um bonito casal. E eu gostei de você viu!

Pouco depois, alguém chega ao apartamento. Era dona Elis. Elvis acorda ao ouvi-la.

ELIS: Elvis? Elvis meu filho apareça!

ELVIS: Eu estou no quarto!

Elvis fala se espreguiçando.

ELIS: Temos uma visitinha. Olha quem encontrei vindo lhe ver…

Elvis leva um susto. Eles são novos em São Luís, ainda não tem amigos conhecidos. Então ele se levanta e sai na porta do quarto.

ELVIS: Quem?

ELIS: Diego, o fugitivo!

Elvis sentiu o chão desaparecer debaixo de seus pés. Não sabia como reagir e ficou paralisado.

ELIS: Quando parei no sinal aqui perto do prédio logo reconheci. Como ele estava vindo pra cá, resolvi dar uma carona.

Os dois ficam em silencio. Elis percebe o mal estar.

ELVIS: Oi Diego.

DIEGO: E aí Elvis?

O silencio volta a pairar.

ELIS: Acho que tem algo fora do normal aqui certo? Vocês precisam conversar… Ontem os dois se divertiram muito. Não quero vocês com essas caras de velório hoje.

Elis se retira da presença dos dois.

ELVIS: Entra aí.

Diego acompanha Elvis e entra no quarto. Elvis se joga na cama tentando ser indiferente. Embora ainda magoado, por dentro ele estava feliz por ver Diego ali.

ELVIS: Então, o que você quer?

DIEGO: Elvis eu não fiz aquilo. Foi ideia de João Pedro, aquele Zé Mané.

ELVIS: Eu sei. Ele falou na diretoria que foi tudo ideia dele.

DIEGO: Viu só? Mas porque você está assim comigo cara?

ELVIS: Mas antes vocês dois estavam planejando algo. E segundo o João Pedro disse que a ideia era sua.

DIEGO: Sim eu sei. É verdade. Eu não nego. Mas isso foi antes de te conhecer. Eu não tinha a menor ideia que na tarde que estava conversando isso com João Pedro fosse acontecer o que aconteceu entre a gente a noite. Você foi super legal, me chamou pra vir na sua casa, sua mãe me recebeu super bem e…

ELVIS: E…?

DIEGO: E… Eu mudei minha ideia sobre você. Você me tratou de uma maneira diferente de qualquer pessoa. Nem meus familiares me trataram daquela maneira! Eu não tenho o menor motivo para fazer qualquer coisa contra você.

ELVIS: Ah, me desculpe, mas tem sim. Pelo menos o Diego da escola, aqueles que todos tem péssimos testemunhos, tem sim!

DIEGO: E você prefere ficar com quem? O Diego que eles falam ou o Diego que você está conhecendo?

Elvis silencia um instante.

ELVIS: Eu não sei.

DIEGO: Elvis eu não tenho o porquê fazer nada de idiota contra você porque…

ELVIS: Por que…?

DIEGO: Por conta disso aqui…

Diego surpreende Elvis com um beijo. Um beijo mais demorado. Intenso. A princípio recebido com estranheza, mas segundos depois Elvis se deixa levar. E após o beijo, os dois se afastam e se entreolham.

ELVIS: Eu não sei qual Diego está diante de mim agora.

DIEGO: Eu queria poder explicar pra você muitas coisas, mas a única coisa que tenho certeza no momento é somente uma.

ELVIS: Qual?

DIEGO: Que eu gosto de você, cara. É isso. É complicado pra mim falar disso, devo estar ficando maluco eu não sei. Mas é o que você ouviu.

Diego se afasta até a janela do quarto. Retira o celular do bolso e coloca a música Macaé de Clarice Falcão.

DIEGO: Passei a tarde ouvindo essa música enquanto pintava o muro. Eu só lembrava de você, da noite anterior, sei lá, mas é como se de repente tudo isso tivesse que fazer parte da minha vida. Que eu não pudesse me afastar de ti porque contigo eu sei o que é o melhor a se fazer. Então eu percebi que estou gostando de ti. De uma maneira ainda meio confusa, mas estou.

ELVIS: Confusa?

DIEGO: É.

Elvis se joga na cama com olhar distante, para além do teto do quarto. O celular toca Clarice Falcão.

DIEGO: Você não vai falar nada? Quer que eu vá embora?

ELVIS: Você já gostou de outros meninos?

Diego caminha de volta pra cama e senta.

DIEGO: Gostar, eu não sei. Acho que não. Está acontecendo um troço diferente aqui nas ideias. Mas tem uma coisa: já fiquei com dois garotos. Preciso te pedir que isso fique em segredo?

ELVIS: Não precisa.

DIEGO: Há dois anos eu fiquei pela primeira vez com meu vizinho. Ele me beijou. Primeiro dei um soco, mas continuei visitando ele e isso foi se repetindo. Eu até acho que gostava dele. Ou era um simples apego por conta da novidade.

ELVIS: Você não estranhou ficar com outro homem?

DIEGO: Claro. Pra mim foi um susto saber que eu beijei um homem. Eu tinha uma curiosidade, não vou mentir, mas não era algo que me levou ir atrás de beijar caras. Foi ele que me beijou.

ELVIS: Hum.

DIEGO: Depois ele foi embora e eu não fiquei mais com ninguém. No meio do ano passado apareceu um garoto na aula de judô e a gente ficou uma ou duas vezes. Só que eu já estava ficando com uma menina da escola. Resolvi que iria deixar essa história de lado e ficaria só com meninas.

Elvis solta um leve sorriso.

DIEGO: Viu só? Você está rindo de mim.

ELVIS: Eu não estou rindo de você. Estou rindo da situação.

DIEGO: Pra mim é muito difícil lidar com isso. Eu não quero ser apontado, rotulado e servir de chacota para ninguém por conta disso. Eu só quero poder ter minha vida e fazer o que quero. Eu sou um homem como outro qualquer.

ELVIS: Você é um homem. Assim como eu.

DIEGO: É, mas você é…

ELVIS: Você também é!

DIEGO: Ok, vamos parar. Eu só queria que soubesse que você está me fazendo muito bem e eu quero que isso continue.

ELVIS: E o que você pretende?

DIEGO: Que primeiro me ajude a entender o que está acontecendo comigo.

Elvis abre um imenso sorriso e abraça Diego.

ELVIS: Você é odiosamente amável.

Os dois continuam abraçados. Dona Elis aparece na porta.

ELIS: Parece que se entenderam né? Muito rápido por sinal. Ainda bem. Vamos sair pra lanchar?

ELVIS: Mãe estou meio cansado. Acho que Diego também. Pode pedir o lanche? A gente ainda tem que conversar um pouco.

ELIS: Entendo. Ok, vocês são quem mandam.

Elis sai discando um número no celular.

ELVIS: E o que vai ser de nós?

DIEGO: Não sei. Não tenho a menor noção de como funciona isso com vocês.

ELVIS: Com vocês não. Com a gente.

DIEGO: Então…

ELVIS: Vamos ficar em segredo só entre a gente.

Elvis estende a mão.

DIEGO: Nosso segredo.

Diego aperta a mão de Elvis.

ELVIS: Parece coisa de filme. O Segredo do Instituto Daniel de La Touche!

DIEGO: Será que daria um bom roteiro?

ELVIS: Não sei. Mas um bom diário sim. Vou começar a escrever sobre nós. Desde o meu primeiro dia em São Luís até onde Deus nos permitir ir.

Diego ri. E os dois de beijam novamente.

“Diego mexe comigo de uma maneira que jamais ninguém mexeu. Do ódio ele revirou meus sentimentos e eu já estava ali novamente querendo ele para mim. Me parecia ainda assim arriscado. Mas eu queria arriscar. Ele não era o que eu esperava de um namorado, nem sei se chegaríamos a ser, mas eu sentia que poderia mudar as coisas na vida dele. Ah Diego! Eu me sentia tão feliz por tê-lo comigo ali. Me sentia mais ainda por ser o único a conhecer um Diego que maioria, senão todos, da escola nem sequer poderiam imaginar que existia. Aquele era o meu Diego. O meu Diego secreto. Só meu. Somente.”

(Trecho do diário de Elvis Braga)

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