Cantiga de Amor

Capítulo 19 – Cantiga de Amor

Cena 01: Povoado das Hortaliças. Casa de Enzo.

Prudência – Esperar só irá aumentar a dor de nossa filha. O melhor para ela, agora, é dedicar sua vida a Deus. Se tu concordares, Agnella irá para o convento.

Enzo – (Surpreso) C-como? Tens certeza do que tu falas, mulher? Essa ideia é uma completa loucura!

Prudência – Mas eu não penso assim. A nossa filha não pode ficar dentro daquele quarto por toda a vida. E, se ela não poderá sair de lá casada, é mais certo que ela saia de lá para tornar-se freira.

Enzo – Pode ser que não estejas tão louca assim. Continuo achando que Adelmo é a nossa melhor escolha… Mas Agnella tem que ter um futuro certo. (Ele se levanta) Prudência, eu irei ponderar os fatos enquanto eu trabalho. Quando eu voltar, nós conversaremos com nossa filha, não importa qual seja a minha decisão.

Prudência – Obrigada por me dar atenção, marido. Também estou sofrendo com isso, porém acredito que não há mais nada que se possa fazer.

Cena 02: Litoral italiano. Região portuária.

A missa na Igreja del Mare acabou, e todos os combatentes da Guerra Santa já estavam no píer se despedindo de quem os acompanhou até ali.

Edetto – Tens que ser forte, meu filho. Tens que ter coragem.

Izabella – (Chorando) Eu não sei se vou suportar essa tua distância… Meu consolo é que eu sei que lutarás por uma justa causa…

Gustavo – (Com as lágrimas quase saindo) Eu já falei, não foi, mãe, que eu voltarei? Eu prometo à senhora e ao senhor que ainda voltarei para casa, e para lutar pelo que mais importa para mim.

Edetto – (Preocupado) Por acaso tu te referes à moça com quem tu casarias, meu filho? Se for, é melhor que esqueças isso. Já passou, não voltará mais. Tu encontrarás outra pessoa, alguém que realmente seja a vontade de Deus. Podes ter certeza.

Gustavo – Eu não sei, pai… Eu… Não sei.

Izabella – Vá em paz, meu filho. Que Deus te acompanhe. Eu rezarei todos os dias e todas as noites por ti.

Gustavo – Obrigado.

Gustavo beija os seus pais, e segue para o navio. Os pais dele voltam e se juntam ao padre.

Santorini – Não chores, minha filha. Essa foi a melhor solução para ele.

Izabella – (Um pouco surpresa) O que disseste, padre? Porque usaste a palavra “solução”?

Santorini – Por nada, Izabella, por nada. Voltem, eu vou falar um pouco com o filho de vocês.

Cena 03: Convento.

Após se reunirem no pátio principal do convento, as noviças se dispersaram, e Valentina começou a realização da limpeza do convento. Quando ela estava limpando próximo à sala da irmã Francisca, ela a viu passando furtivamente.

Valentina – Estranho… Por que a irmã Francisca estava desse jeito? É melhor eu observar.

Valentina resolve seguir a freira, que entra na sua antessala. Quando Valentina entra no mesmo recinto, não vê ninguém. Por isso, ela se dirige à porta da sala da diretora do convento. Estava trancada. Ela encostou o ouvido na porta e não ouviu nenhum som ou ruído. Deu duas batidas, mas não obteve resposta.

Valentina – (Intrigada) Estranho… Parece que não tem ninguém. Mas onde foi parar a irmã Francisca? Como ela sumiu, assim, de repente?

Cena 04: Litoral italiano. Região portuária. Píer.

Santorini – Entendeste, não foi? Toma cuidado nessa viagem. E que tenhas juízo, meu filho.

Gustavo – Está certo, padre. Eu entendi perfeitamente que ao voltar não poderei passar pelo Povoado nem pela Igreja.

Santorini – Muito bem. Vá em paz.

Gustavo se despede do padre, e entra no navio. O alvoroço é grande. Buscando se livrar de tanta confusão, ele se dirige à popa. Ao chegar lá, encontra apenas um homem, parado, olhando para o mar. A princípio, ele permanece um pouco afastado do homem, mas depois decide se aproximar.

Gustavo – Olá! Bom dia, cavalheiro!

Marconi – (Sem dar muita atenção) Bom dia para você também.

Gustavo – Me chamo Gustavo. Muito prazer…

Marconi – (Completando a lacuna deixada) Marconi. Não sei se posso lhe dizer o mesmo. Vim aqui para ficar sozinho. (Se vira e começa andar, de costas pra Gustavo, que o segue) Se veio aqui para falar sobre como será boa a viagem, a Guerra Santa, peço que procure outra pessoa. Não quero conversar sobre nada agora.

Gustavo – Perdão… Marconi, não é? Creio que estejas nervoso por algum motivo, e não tiro tua razão em achar que vim conversar sobre a Guerra Santa. O alvoroço nesse navio está tão grande, não é mesmo? Mas eu também vim até a popa para ficar sozinho.

Marconi – (Um pouco mais “manso”) Então por que você resolveu conversar comigo?

Gustavo – Porque não sei se conseguirei passar essa viagem toda pensando no que deixei para trás, pensando na, nas pessoas de quem estou sendo obrigado a me afastar…

Marconi – Disse que está sendo obrigado? Não está aqui por vontade própria? Não é como aqueles homens que eu, e você, vimos há pouco?

Gustavo – Não. E também não sei se deveria ficar falando sobre isso. Mas, ao que parece, tu também não estás empolgado com o objetivo final dessa viagem.

Marconi – Você tem razão. Na verdade, eu tenho… Outros objetivos, por assim dizer. Contudo eu não quero comentar sobre tal assunto agora.

Gustavo – Eu entendo. Por acaso conheces algum desses homens que estão aqui?

Marconi – Você é o primeiro com quem eu falo.

Gustavo – Tu também és. (Ele estende a mão a Marconi) Posso acompanhá-lo nessa viagem?

Marconi – (Apertando a mão dele) É, gostei de você. Vamos andar juntos.

Cena 05: Povoado das Hortaliças. Casa de Enzo. Final da tarde.

Agnella chega à sala e se senta.

Agnella – O senhor me mandou chamar, pai?

Enzo – Sim, Agnella. Sente-se. (Ela senta) Prudência, por favor, fale para ela o que tu me falaste hoje.

Prudência – Minha filha, eu e teu pai estivemos conversando acerca do teu futuro. Nós pensávamos em casar-te…

Agnella – Com Gustavo? Ele veio me procurar, não foi? O senhor e ele se entenderam?

Enzo – Esse homem não veio me procurar, e mesmo se tivesse vindo, eu o mataria! O que tua mãe dizia é que pensávamos em casar-te com outro homem. Mais especificamente, com Adelmo.

Agnella – (Surpresa) Com Adelmo? Mas, mas… Ele não sofreu um acidente? Ele não está… (Baixa a cabeça e fala baixo) Quase morto?

Prudência – Cruzes, filha! Ele parece estar morto, mas Deus há de ter piedade dele. O problema é que não sabemos quando a vontade do Senhor o fará acordar, e não queremos fazer-te sofrer esperando um homem moribundo recuperar os sentidos.

Agnella – E o que pensam em fazer?

Enzo – Bem, o que eu e sua mãe decidimos foi que o melhor para ti é dedicar-te a Deus.

Agnella – (Começa a ficar apavorada) E o que isso significa? Eu… eu…

Enzo – Você irá para o convento. Irá se tornar uma freira para ajudar no serviço do Senhor.

Agnella – Não! Eu não quero isso! Não quero!

Agnella se levanta para correr para o quarto. Dessa vez, Prudência a segura.

Prudência – Filha! Entenda que isso é o melhor para ti!

Agnella – (Senta novamente) Não!! O melhor para mim é Gustavo! Onde ele está? A senhora me prometeu que falaria com ele! E hoje a senhora me diz que eu irei para o convento!

Prudência – (Senta ao lado dela, e começa a passar a mão em sua cabeça) Eu não quis te contar, mas ele foi embora. A freira, irmã Francisca, me garantiu que ele não voltará mais. Então, por que ficar com esperanças de que ele virá? O melhor, minha filha, é ter um foco, assumir um compromisso. Um compromisso com Deus.

Agnella – Ele foi embora… Ele não se despediu de mim… Ele…

Agnella abraça a mãe.

Prudência – Calma, minha filha. Tudo isso vai passar, tenha calma… (Em pensamento) Meu Deus, tomara que minha filha seja feliz! Tomara!

Cena 06: Navio. Popa. Final da tarde.

Depois que se conheceram, Gustavo e Marconi passaram a andar juntos. Estavam se tronando amigos.

Gustavo – O navio ancorou. Estão comentando que esqueceram alguns mantimentos no porto, e um barco menor voltará lá para buscar o que falta. Parece que demoraremos um pouco mais para chegarmos a nosso destino…

Marconi – De certa forma, sim, apesar de que não ficaremos muito tempo esperando. (Pequena pausa) Mas então quer dizer que você é, ou era, um desses cavaleiros andantes, que costumam viajar costurando esses feudos, conhecendo pessoas, mulheres…

Gustavo – Pessoas, sim. As mulheres já estão incluídas nas pessoas. (Melancólico) Na verdade, somente uma mulher me interessou… Somente uma mulher me fez pensar em criar raízes…

Marconi – Mas, pelo visto, você teve que se separar dela. Foi a ela, não foi, que você se referiu quando disse estar sendo obrigado a se afastar de algumas pessoas?

Gustavo – Foi a ela, sim. Eu quase cheguei a noivá-la.Porém, de repente, tudo… Desmoronou.

Marconi – De certa forma, eu sei do que você está falando.

Gustavo – Sabes? Tu também tiveste que deixar um amor para trás?

Marconi – Não é bem disso que estou falando. (Ele olha em volta) Eu preciso contar-lhe por que eu estou aqui nesse navio.

Gustavo – Tu me disseste que possuía certos objetivos.

Marconi – Justamente. (Ele olha de novo em volta) Mas ninguém pode saber deles. Eu só irei contar a você porque… Eu estou muito doente.

Gustavo – (Assustado) Doente? Mas tu pareces tão bem!

Marconi – Somente na aparência. Talvez… Talvez eu chegue a morrer aqui mesmo nesse navio, e não consiga alcançar meus objetivos.

Gustavo – Não fales algo assim! Tu não morrerás!

Marconi – A minha situação é grave. Tenho tido com cada vez mais frequência enjoos, tenho passado muito mal, perdi muito peso. Eu estou pálido, meu corpo não é mais o mesmo. Os médicos, a igreja… Não souberam explicar o que é isso. Mas, caso eu faleça antes de chegar aonde eu quero, alguém de confiança tem que alcançar as minhas metas por mim.

Gustavo – Por favor, estás me deixando nervoso. Do que tu falas, exatamente?

Marconi – De um tesouro. Eu estou aqui, nesse navio, porque eu preciso alcançar um tesouro.

Gustavo – (Surpreso) Um… Tesouro? Por favor, explica-me melhor essa história!

Marconi – Na verdade, isso… (Ouve-se um barulho próximo a eles) Tem alguém aqui. Não posso continuar essa conversa agora.

Gustavo – Entendo, entendo. Vamos sair daqui.

Cena 07: Navio. Minutos depois.

Brás está caminhando em uma das laterais do navio, pensando em algo que acabara de ouvir.

Brás – (Pensando) Um tesouro? Se isso for verdade, eu preciso consegui-lo para mim, e, depois, eu vou dar um jeito de surpreender a Inês e aquelas duas velhas… Mas como? Como poderei surpreendê-las?

Então, ele chega a um compartimento onde há apenas um homem, que está passando mal. Ao ver Brás, esse homem começa a gritar.

Homem – Me ajude! Por favor, me ajude!

Brás – (Corre para acudi-lo) Como é o seu nome? O que houve?

Homem – Ma… Magno. Eu… Vou… Morrer…

O homem começa a ter convulsões. Depois de se debater muito, e com o olhar suplicante para Brás, ele morre. Algum tempo depois, outros homens chegam ao local.

Comandante – Mas como esse homem morreu? (Dirigindo-se para Brás) Tu estavas com ele?

Brás – Quando eu cheguei, ele já estava se debatendo muito, parecia louco. Não tive tempo de chamar ajuda. Ele… Morreu na hora. (Começa a forçar um choro)

Comandante – Mas por acaso tu o conhecias? Sabes como ele se chamava?

Brás – Sim, sim, eu o conhecia. O nome dele era Brás. Brás da Mata.

8 thoughts on “Capítulo 19 – Cantiga de Amor

  • HAHAHAHA Achei fantástica a atitude de Brás, muito inteligente. Quanto à Gustavo acredito que tenha sido uma boa parceria firmada com Marconi, vamos ver no que isso vai render e como esse tesouro vai dar novas trajetórias a essa história. Agnella pelo visto vai seguir a linha de mocinha sofredora. Será? Seguirei acompanhando a história, ainda que aos pouquinhos ahahha

    • De grão em grão a galinha enche o papo rsrsrs
      Brás teve que “pensar rápido”, e optou por um caminho que lhe deixa em “segurança”. Gustavo e Marconi formam uma parceria breve, mas com consequências importantes. E Agnella… Bem, não sei se isso é um defeito, mas ela vai sofrer, sim, mas os caminhos que ela seguirá e suas atitudes mais pro futuro podem variar um pouquinho dessa coisa de “só chorar” e não fazer nada.
      Obrigado!

  • Nossa, ótimo capítulo. Não esperava outra atitude do Brás, que agora vai se passar por outro homem. Agnella pelo visto vai mesmo pro convento :((
    E entrou um novo personagem, Marconi, e também uma nova trama, a do tesouro. Isso vai render! Vou ler os próximos capítulos 😀

    • Sim, sim. Isso vai render. Porque a trama do tesouro envolve outros personagens… E essa trama envolve Gustavo, Marconi, Brás, os novos personagens, e trará algumas surpresas.
      Agnella foi para o convento, mas ela não estará conformada com esse lugr não. E a ~coincidência do destino~ (kkkkkk) a fez parar no mesmo quarto que Valentina, que também possui o desejo de sair de lá. É como disse Júlio Cesar: “Alea jacta est” – A sorte está lançada!
      Espero por você! E obrigado pela participação! 😀

  • Mas esse Brás é um inergumero mesmo, o que ele vai aprontar agora? Assumir uma identidade de outra pessoa? E já está de olho no tesouro do Marconi, que pelo visto vai deixar uma trajetória para que Gustavo cumpra.
    Agnella está sofrendo coitado, acredita que foi deixada pelo seu grande amor, vem muito mais por aí, tó amando. EU sabia que essa viagem mudaria em muito a vida de todos!!!! 🙂

    • A viagem mudará, sim… Você inclusive já sabe, os capítulos seguintes mostram muita coisa. Mas ainda virá mais coisa por aí. Brás, Gustavo, Agnella, ainda vivenciarão momentos que não esperavam (ou que não é esperado do público). Conto com você! E o brigado por comentar!

  • O que? Pelo visto vem troca de identidade por ai, um suposto tesouro, a ordenação compulsória de Agnella e um mistério em torno da irmã Francisca? Muita coisa ainda vem por ai. PARABÉNS 🙂

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