Capítulo 10 – A Ilha
– Quem ou o que é Tadita? – perguntei.
– Tajita – Savite me corrigiu. Novamente – Ela é a líder da tribo Rambek.
– A onça é a líder de uma tribo? – não sei se tinha entendido.
– Não! – Savite fez um sinal de desdém com a mão – Não tem nada disso. As patas são de Giba, a jaguar gigante que Tajita usa para montaria.
– Então não tem onça? – perguntei.
– Susi? – Richard se espantou – Por essa eu não esperava.
– O que foi que eu fiz? – perguntei.
– Jaguar e onça são a mesma coisa! – Richard respondeu com uma cara péssima.
– Agora eu que não entendo! – Savite coçou a cabeça.
– Que lindo! – Richard sorriu debochado – O sabe-tudo não sabe que onça e jaguar são a mesma coisa.
– Richard pare de ficar chamando o Savite de sabe-tudo! – me irritei – Será que ninguém pode saber uma coisa a mais que você?
– De qualquer forma quem sabe mais não é a questão! – Savite encerrou a conversa paralela – Tajita voltou. E com isso que devemos nos preocupar.
– Mas você ainda não disse exatamente quem é essa Ta… Ta…
– Tajita! – Richard me interrompeu de forma bem rude. Mas deixei passar. O assunto parecia realmente sério.
– Para começar a falar de Tajita precisamos voltar alguns anos no tempo. – Savite começou.
– Ai, ai – Richard torceu o nariz – Já vi que vem história.
– Richard! – olhei feio para ele – Vamos crescer!
– Quando a nossa tribo chegou a essa ilha, vivíamos todos em paz. Fugíamos de um desastre que ocorreu em nossa terra natal e encontramos aqui um bom lugar para recomeçar. – Savite arrumou a máscara e se sentou – Rondamos a ilha inteira e não encontramos nada e nem ninguém. Pensávamos que a terra estava abandonada.
– Mas não estava! – conclui.
– Exatamente. – Savite continuou – Poucos meses depois apareceram uma tribo que se autodenominavam os Rambeks. Eles nos acusavam de usurpar a terra deles e tentaram nos expulsar com seus grandes jaguares. Mas nós, os Karvals, não nos deixamos intimidar e guerreamos por nossa terra. Eles haviam abandonado a ilha para buscar novos mundos e não conseguiram. Achamos injusto ter que devolver uma terra que eles abandonaram.
– E deixe-me adivinhar – Richard interrompeu – Vocês venceram a guerra e agora essa tribo Rambek quer uma revanche?
– Quase isso. – Savite continuou – Nossa tribo venceu a guerra, mas fomos generosos com os Rambeks e permitimos que eles continuassem em nossas terras.
– Então eu não entendo. – falei – O que aconteceu?
– Nossos ancestrais deram uma boa parte da terra desta ilha, dividindo-a em duas partes. – Savite não parecia gostar desta parte da história – E foi a partir deste acontecimento que as coisas pioraram.
– Deixe-me adivinhar… – Richard tentou falar, mas atirei nele um dos travesseiros que estava ao meu lado.
– Devido ao grande número de jaguares gigantes, começamos a ter uma crise de alimentos. Animais começavam a sumir, frutas ficavam cada vez mais escassas e a pesca não era o suficiente para alimentar as duas tribos. – Savite se aproximou um pouco mais de mim – E a nossa tribo fez algo horrível.
– O que? – não estava gostando do rumo da história.
– Envenenaram os Rambeks. – Savite parecia estar péssimo dizendo isso – Foi a solução que encontraram. Foi um grande massacre. Mas houve sobreviventes.
– Que resolveram se vingar! – Richard parecia decidido a interromper o Savite.
– Sim – Savite suspirou fundo – eles juraram vingança. Mas como estavam em número bem menor, bem, acho que não preciso dizer que foram expulsos da ilha.
– Imagino. – falei.
– Isso faz 100 anos. – Savite suspirou novamente – Há 100 anos os Rambeks guardam esse sentimento de vingança.
– E eles esperaram 100 anos para começar a atacar? – Richard quase gritou.
– Não! – Savite se virou para Richard – Eles já atacaram outras vezes, mas nunca obtiveram sucesso. Até a chegada de Tajita.
– O que houve? – perguntei.
– Tajita foi a única líder dos Rambeks a chegar bem perto de nos derrotar. Foi por muitíssimo pouco que não fomos derrotados desta vez. – Savite se levantou – Esperávamos que ela voltasse, mas jamais imaginávamos que seria tão rápido. Não faz nem um mês que eles nos atacaram.
– Espere um minuto! – gritei – Um mês? Mas como eu não ouvi e nem vi nada?
– Antes de serem expulsos, os Rambeks selaram a passagem para o lado deles da ilha – Savite parecia ficar cada vez mais agitado com essa história – De certa forma começaram sua vingança muito antes das guerras. Devido aos conhecimentos mágicos dos Rambeks, nenhum de nós pode sair deste lado da ilha e nem temos noção do que acontece do outro lado. Mas sei que os Rambeks continuam vigiando o seu lado da ilha, mesmo não estabelecendo residência por lá.
– Conhecimentos mágicos? – estava assustada – Isso é muito para minha cabeça.
– Depois de tudo o que passamos? – Richard parecia achar graça – Honestamente, acho um tanto plausível.
– Está é a nossa história. – Savite deixou cair os ombros, o que fez com que sua máscara batesse nos chão.
– E a Lila perdida no meio de toda essa confusão! – fiquei ainda mais preocupada – Será que aconteceu algo com ela?
– Nossos homens estão atrás dela – Savite tentava me tranquilizar – já disse. Eles irão acha-la.
– Só resta saber como ela será achada. – Começava a perder o controle – E se ela… Se ela… Não consigo nem pensar!
– Calma Susi! – Richard me abraçou – Vai ficar tudo bem.
– Exato! – Savite segurou minha mão – Se algo de ruim tivesse acontecido, ela já teria aparecido. O fato de estar sumida e sinal de que está em movimento. Mas iremos acha-la!
– Tomara que sim! – tentei me acalmar – Espero que sim.
– Acho que posso trazer um pouco de música! – Savite se animou – Quer que eu traga alguns músicos para tocarem para você!
– Acho que não estou com cabeça para música! – tentei sorri – Apesar que faz dois anos que não escuto nada além dos sons de pássaros e ondas. Talvez não seja uma ideia tão ruim assim.
Savite não perdeu tempo. Saiu da cabana rapidamente e voltou quase tão rápido quanto saiu. Trousse três homens mascarados com uma flauta, violão e tambor. Devido ao pouco espaço da cabana, eles tocaram do lado de fora, mas fui carregada até a porta da cabana.
Começaram tocando uma música bem animada e calorosa. O ritmo alegre chamou atenção de quem passava. Alguns se juntaram a nós para ouvir, as crianças dançavam e rapidamente pude sentir uma sensação de bem estar que não sentia desde que chegamos a ilha. A segunda canção foi um pouco mais lenta, com um tom misterioso e envolvente. O brilho da lua e a luz da fogueira deram o clima perfeito. Mas o destaque ficou para o final, quando uma garotinha se aproximou e pediu para cantar uma canção. A voz infantil da garotinha, o som da flauta, do violão, do tambor, aquela lua belíssima, tudo estava contribuindo para que tivesse a melhor noite de todas. Quase foi o suficiente para me fazer esquecer a Lila. Mas isso era impossível.