Jardim Brasil

Jardim Brasil [ep. 7]: A dama de preto

 

 

ÁSTER – GABRIEL FONSÊCA

 “A dama de preto”

Nasci sobre duas carreiras de cocaína e minha parteira estava armada até os dentes. Cresci na favela onde a realidade é muito marginal, desigual, cruel e louca. Aos seis anos fui abusada sexualmente por um homem qualquer que se dizia ser um fiel amigo da família, o pastor da igreja que eu frequentava. Era um verdadeiro “homem de deus” fajuto, pois todos do morro sabiam que às dez horas da noite a cada dois sábados de cada mês chegavam armas e drogas na favela. Sabiam que o pastor Valronei comandava o tráfico no morro.

 

Morro da Ovelha. 1983.

O pastor Valronei, fazia as suas pregações na igreja. Francieli estava sentada junto à sua família em um canto retirado da igreja. O pastor suava, pois aquele era um dia de calor infernal, as pessoas se abanavam, e as luzes piscavam.

Valronei: Em nome do senhor… Ouviram bem? Em nome do senhor, quando dizerem bem alto, “amém”, todos os seus males irão desaparecer! Meu povo… Digam amém para que os seus males desapareçam!

As pessoas presentes gritaram o amém no exato momento em que vários policiais adentram a igreja e fuzilam o pastor. Um grande tiroteio acaba por se formar. Francieli se perde da sua família, ela está perto do corpo do pastor Valronei.

Francieli: Sabe qual foi o seu problema? Ter dito que todos os nossos males iriam desaparecer quando disséssemos amém! Eu disse amém!

Ela ergue a cabeça para o alto junto com as suas mãos.

Francieli: Obrigado senhor! – cospe no corpo do pastor e sai correndo do local.

 

Quando eu completei meus 16 anos, descobri um novo mundo, saía às três da tarde de um dia e voltava às onze da noite do outro dia. Era agredida quase que diariamente por meu pai, que vivia bêbado.

Francieli abre a porta da casa e tira os seus sapatos, seu pai aparece e acende a luz.

Roberto: (Bêbado) Eu… Eu avisei… Eu avisei sua vadia!

Roberto pega nos cabelos de Francieli.

Francieli: Me solta pai… Me solta! Socorro!

Roberto rasga a roupa da sua filha, que jogada no chão é chutada, pisada e soqueada.

No quarto de Roberto, Francieli, junta uma almofada do chão e afoga o seu pai sem muito desespero. Roberto morre.

 

Após matar meu pai, já que minha mãe morreu no parto, não tinha eu onde ficar e nem para onde ir, pelo menos no Brasil. Fugi com um milionário para a Austrália, da Austrália para os Estados Unidos, Japão, Suíça. Um marido, um nome, uma cor de cabelo, uma cor de roupa predileta, tudo isso mudou conforme me mudava de país. Depois de 28 anos da minha fuga desse país imundo, tive que voltar. O motivo? Fiquei pobre, pois perdi todo o meu dinheiro em um jogo. Agora estou eu no Brasil, pobre, um tanto quanto entojada, ruiva. Mesmo com meus 42 anos de idade, ainda dava uma “boa canjica” com caldo de cana bem doce, doce tão quanto o prazer que sabia eu dar aos homens que me procuravam… Uma nova vida na prostituição!

 

 

Prostíbulo Fênix. 2017.

Nasci Francieli, cresci Lili, mas para viver tive que adotar várias outras identidades, e nessa nova temporada no Brasil, me alcunho por Áster. Segundo a lenda, Áster é uma flor originária do pó que caiu das estrelas. Não gosto dessa lenda, porque para começar, eu não sou uma flor, e se forem me chamar de flor, prefiro que me chamem de “A Dama de Preto”.

Áster toma seu banho de sol, pelas frestas das madeiras da cerca, alguns garotos a observam. Tiffany aparece.

Yris vê os garotos olhando Eva – Mas o que significa isso? Saiam daqui seus pirralhos, andem!

Áster: O que foi isso Tiffany?

Tiffany: O que foi? O que foi é que tinham uns dez cachorros te comendo com os olhos por aquelas frestas da cerca!

Áster: Pelo menos pelas frestas! Qual é Tiffany, eu gosto de ser desejada… E você sabe disso!

Tiffany: Acontece que aqui, nem para te olhar é de graça… Não em quanto estiver dentro do meu estabelecimento!

Áster se levanta da cadeira em que estava, amarra o seu lenço na cintura e sai.

Tiffany: Trate de tomar um banho e se arrumar. Hoje é sexta, dia de casa cheia e você muito bem sabe quem eles mais procuram nas sextas!

Áster ergue o seu dedo do meio.

Tiffany: Vai fazendo assim… Selvagem!

Tiffany volta a olhar por cima da cerca, para ver se os garotos haviam saído dali mesmo.

 

Áster adentra o seu quarto e sente alguns cheiros diferentes dos perfumes dos quais usa.

Áster franje suas sobrancelhas – Que cheiro… Que cheiro horrível de perfume de vadia.

Áster olha atrás das cortinas, não vendo ninguém, ela continua sua busca incansável por alguma “vadia”, que pudesse ter invadido o seu quarto. Ela olha em baixo da cama, mas resolve parar e escutar alguns barulhos, ela olha para a porta do banheiro, correndo e abrindo. Pega uma de suas amigas do prostíbulo, tomando banho em sua banheira.

Áster para na porta do banheiro – Que linda… Que maravilha essa cena… E aí, tá gostando da MINHA banheira?

Núbia olha para Áster, que a olha com um olhar de ódio – Qual é Áster, sabe quantas banheiras existem aqui?

Áster se aproxima de Núbia, e pega no seu braço – E você sabe de quem é essa banheira? Sai daqui, sua gralha!

Áster arrasta Núbia, pelo braço para fora do banheiro.

Núbia: Sua vaca sem escrúpulos… Existem treze quartos nessa zona, e apenas o seu e o da Tiffany, que tem banheira!

Áster: Eu não quero saber, suma daqui antes que eu arranque todos os fios de cabelo da sua cabeça!

Núbia ainda pede para vestir suas roupas, mas Áster a tira do quarto nua. Depois de feito isso, a dama de preto, tira sua roupa, vai para o seu banheiro e entra na sua banheira.

As horas passam e ela continua a relaxar em sua banheira. Fecha os olhos e dá um mergulho, após voltar do mergulho sai da banheira, totalmente nua, indo para o seu armário, escolher a roupa da noite.

Áster abre as portas do armário – Vamos ver o que vestir nessa noite…

Áster experimenta várias roupas, desde camisas, camisolas, a vestidos longos, que não a agradou muito. No final de tudo, acaba por ficar com uma calcinha fio-dental preta e uma camisola transparente, também preta. Para completar, ela ainda passa um batom preto, bate os cabelos e se joga na cama, a noite de sexo da sexta-feira se inicia as sete e faltavam apenas quinze minutos.

 

 

No corredor que dá acesso ao quarto de Áster, encontra-se uma enorme fila de pessoas formada por mulheres e homens, em sua maioria. Eles conversam alto, parece que está acontecendo algo. Tiffany aparece para ver o que está acontecendo.

Tiffany: Gente… Gente! O que está acontecendo aqui?

Homem1: Eu que pergunto…

Homem2: Estamos aqui tem mais de trinta minutos!

Mulher1: Será que a dama não morreu?

Áster abre a porta, todos olham para a porta no mesmo instante, os olhos dos homens e mulheres que ali estavam, brilhavam como se estivessem vendo um pote de ouro ao final do arco-íris.

Áster: Alguém me explica o motivo desse fuzuê todo?

Homem3: Minha deusa… Nós estávamos aguardando você!

Mulher1: Pensei que você teria morrido… Graças a Deus que você está inteirinha, só pra mim!

Homem4: Só pra você nada… Não sei se você não reparou, mas aqui tem no mínimo, umas dezesseis pessoas, logo, ela não é só sua!

Mulher2: Além do mais, eu tenho dinheiro que sobra pra pagar ela, e assim ela ficará comigo por mais tempo!

Todos começam a discutir.

Tiffany: CHEGA! Eu vou conversar com a Ást… Quero dizer, com a dama de preto, e já a libero!

Tiffany adentra o quarto de Áster.

 

Tiffany conversa com Áster.

Tiffany: Porque demorou tanto assim?

Áster: Eu peguei no sono, me acordei e tive que retocar toda a maquiagem e arrumar o cabelo novamente!

Tiffany: Que isso não se repita!

Áster se vira para o espelho e bate o cabelo.

Tiffany: Mas… E você?

Áster: Eu o que?

Tiffany: Vai aguentar dezesseis pessoas?

Áster se vira para Tiffany- Meu amor… (Áster pega na nunca de Tiffany) Eu aguento todas as pessoas que estão ali fora, e no final… Eu aguento você!

Áster põe uma mão no seio de Tiffany.

Tiffany fica nervosa – Tudo… Tudo… Tudo bem. Eu… Eu vou sair e chamar… Chamar o primeiro ou a primeira…

Tiffany vai em direção à porta e tenta abri-la, mas está trancada.

Áster: Está trancada… Esqueceu? Foi você mesma quem fez isso!

Tiffany sorri, abre a porta e sai. Logo após ela sair, entra o primeiro cliente.

Garoto: (Se mostra tímido) Oi!

Áster: É virgem! Deite-se na cama… Vou te fazer feliz!

O garoto se deita na cama.

Aos poucos, a fila do lado de fora do quarto vai diminuindo e Áster atende a bissexuais, heterossexuais, lésbicas, casados, solteiros, virgens…

 

Aquela sexta-feira foi o dia em que eu mais fiz sexo em toda a minha vida, mas mesmo assim, se após o último da fila, surgissem mais três ou quatro, eu estaria disposta, pois sexo para mim era algo que eu gostava de fazer e sem nenhum esforço. No final daquela noite, acaba por adentrar o meu quarto, o último cliente, um homem gostoso, alto, de olhos castanhos, de cabelos pretos, parecia um executivo, mas eu mantive o profissionalismo e não perguntei qual era a sua profissão.

O homem tranca a porta, tira o seu blazer, os sapatos e a calça. Áster, resolve interromper.

Áster: Ei, o que é isso gostosão? Eu faço questão de tirar toda a sua roupa!

Luan, o homem apressado, agarra Áster e lhe dá um beijo de arrancar o fôlego. Após o beijo, ela fica perplexa e olhando para o rapaz, um olhar profundo, tanto que ela nem percebe que já havia sido jogada na cama, e que o rapaz estava mordendo sua barriga. Áster fecha os olhos e resolve sentir algo que ela nunca mais tinha sentido antes, prazer.

Após transarem, Áster e Luan, conversam.

Áster: Como é o seu nome?

Luan: Não revelo o meu nome na primeira vez!

Áster se levanta da cama – E vai ter a próxima?

Luan olha para Áster – Quem sabe!

Luan pega o seu blazer e sai do quarto, quanto que Áster se deita na cama novamente, pega o lençol e começa a cheirar.

 

Naquela noite me pus a pensar no rumo que as coisas me levaram, em todos os anos de minha vida em todas as aprendizagens, em todos os assassinatos, nunca senti nada igual, talvez tenha eu tampado o sol com a peneira e deixado o tempo dar conta das minhas coisas.

 

Todas as garotas tomam o café da manhã na cozinha do prostíbulo. Áster acaba de acordar e está chegando à cozinha.

Áster: Bom dia garotas!

As garotas respondem ao bom dia de Áster. Núbia resolve ser gentil da sua forma.

Núbia se levanta da mesa onde estava com a xícara na mão e vai lava-la, tudo isso ela faz encarando Áster, com um sorriso de deboche.

Áster: O que tu tá me olhando com essa cara de cadela desmamada?

Núbia: Tá falando comigo?

Áster: Pois é, eu acho que é a única com cara de cadela desmamada aqui!

Núbia começa a rir, Áster se irrita pega nos seus cabelos e começa a gritar.

Áster: Tu tá de deboche com a minha cara? Aliás, isso não se chama deboche, se chama inveja!

Núbia: Inveja? Inveja eu tenho daquelas milionárias, de você eu tenho é pena!

Áster: Porque é galinha!

Núbia se solta das mãos de Áster, ela amarra os seus cabelos e vai saindo, mas antes de sair da cozinha, ela para na porta e diz:

Núbia: Nojenta… Ninguém te ama, e quando tu parar para pensar nisso, você vai saber que a única coisa que as pessoas querem quando te procuram é sexo… Ninguém te ama e nem nunca vai te amar!

Áster junta a xícara de cima da mesa e arremessa em Núbia, mas acerta na porta. Tiffany aparece na cozinha após ouvir os barulhos.

Tiffany: O que está acontecendo aqui?

Áster: Aquela desgraçada da Núbia… Eu ainda mato ela!

Tiffany distribui as tarefas do dia para as garotas da Fênix e Áster estranha, não teve nenhuma tarefa designada a ela.

Áster: E eu, não vou trabalhar hoje?

Tiffany: Vai, mas não limpando e nem muito menos passando… Você vai trabalhar, transando!

Áster: Como assim?

Tiffany: Você tem encontro marcado com um homem, esteja arrumada às três horas da tarde. Nem uma hora a menos e nem a mais!

 

Áster e o executivo adentram aquele quarto de motel. Ela tira o seu vestido, fica de calcinha e sutiã. A mulher aguça os olhares daquele homem, que vidrava os olhos nas encantadoras curvas do corpo dela. Áster mexe nos seus cabelos, se vira para o homem e pelo enorme espelho, enxergava que o homem continuara a babar. Ela tira o seu sutiã, mas deixa o homem vê-los somente pelo espelho. Áster se vira para o executivo.

Áster: E você não vai tirar a roupa?

O executivo começa a tirar a sua roupa, tira os seus sapatos, calça, gravata, sua blusa, seus óculos e sua aliança. Áster se atenta ao momento em que ele tira a sua aliança e por um instante vem à mente o que Núbia havia lhe dito pela manhã.

Áster: Quais são os motivos?

Executivo: Do que você está falando?

Áster: Dos motivos de deixar sua mulher em casa e procurar meus trabalhos!

O executivo se levanta da cama de onde estava sentado – Escute aqui, não te paga para dar satisfação da minha vida, não te pago para pensar, eu te pago para transar.

O homem pega nos cabelos de Áster, a joga cama, onde que sem carinho algum. Ele inicia o ato sexual com selvageria e brutalidade. Áster resolve interromper.

Executivo: O que aconteceu?

Áster: Nada, só não quero mais!

Executivo: Não existe “não quero mais”. Estou te pagando para isso!

O executivo pega no braço de Áster tentando força-la a transar.

Áster: Me solta! (Áster se solta e dá um tapa na cara do executivo)

Executivo: O que você pensa que é? (Pega nos braços de Áster) Sua puta, se eu te paguei, você vai ter que transar comigo!

Áster começa a olhar no fundo dos olhos do executivo e algo a remete ao passado. Começa a ver o seu pai segurando os seus braços. Tudo o que aconteceu volta a atormenta-la. Áster, em um ato de impulsividade, consegue sair das mãos do homem, pega em seu pescoço e o atira na cama.

Áster: Escute aqui seu desgraçado, eu não sou obrigada a nada! Volte para a sua casa e de graças a Deus que você tem uma mulher que te aguenta!

Áster veste a sua roupa, pega a sua bolsa e vai saindo.

Executivo: E o meu dinheiro?

Áster: Se resolva com a Tiffany!

Áster sai do quarto.

 

Áster adentra o prostíbulo com um olhar de transtorno e Tiffany a aborda.

Tiffany: Ei, foi tão rápido assim?

Áster: Foi!

Tiffany: Já vi que aconteceu alguma coisa. O homem broxou foi?

Áster: Não, ele me fez broxar…

Tiffany: Como assim?

Áster: Eu não consegui transar com ele porque ele foi um bruto, um machista… Além disso, tentou me bater e isso eu não admito!

Áster dá as costas para Tiffany.

Tiffany: Eu vou descontar todo o prejuízo do seu dinheiro!

Áster: Tudo bem. Não tem problema.

 

A noite logo chegou. Áster já estava a trabalho, já havia transado com dois homens e aguardava o próximo. De dentro do banheiro, ela sai, e leva um susto ao ver quem estava a esperar no seu quarto.

Áster, de cabeça baixa, ergue a cabeça após ouvir uma voz muito conhecida, mesmo por tê-la ouvida há um dia.

Luan: Luan!

Áster ergue a cabeça – Você? O que disse?

Luan: Luan, meu nome é Luan… Lembra que você tinha me pedido ontem, qual era o meu nome?

Áster: Nome lindo para um homem lindo!

Luan se aproxima de Áster e passa a sua mão no rosto dela.

Luan: Eu só te conheço por A Dama de Preto, mas qual é o seu nome verdadeiro?

Áster: Áster!

Luan pega a mão de Áster – Está sendo um enorme prazer te conhecer.

Áster agarra Luan, e se jogam na cama.

 

Eu nunca pensei. Nunca se quer parei para pensar que em algum dia eu iria me entregar a um dos venenos mais letais, que te despedaça mais por dentro, do que um tiro disparado por fora e que acerta a sua cabeça. Nunca pensei que eu iria me apaixonar e na hora menos apropriada, o amor ataca como um crocodilo a sua presa. Os encontros com Luan se tornaram cada vez mais frequentes e o fogo da paixão ardia mais e mais.

 

Áster está no banheiro e Tiffany a procura.

Tiffany: Áster, onde está você? Precisamos conversar!

Tiffany escuta uns barulhos vindos do banheiro.

Tiffany: Áster, você… – leva um susto ao vê-la caída perto do vaso sanitário – Áster! O que aconteceu?

Tiffany: Eu… Eu estou mal, vou vomitar meus órgãos!

Tiffany encara Áster, que está muito amarela e com os olhos inchados.

Áster: O que foi?

Tiffany: Quando foi a sua última menstruação?

Áster: Eu… (Áster se levanta) Eu não estou grávida!

Tiffany: Isso é o que descobriremos. Amanheceu há pouco tempo, você ainda não deve ter urinado… Eu vou pegar o teste para você fazer!

Áster: Não deve ter nenhuma farmácia aberta uma hora dessas!

Tiffany: Meu amor, você já devia de saber que eu sou muito esperta e prevenida. Vou buscar um teste para você.

 

Tiffany sai do quarto, ela vai até o local do estoque, pega um teste e volta. Áster demora a falar o resultado do teste e Tiffany bate na porta.

Tiffany: Áster, abra essa porta. Abra essa porta agora!

Áster sai do banheiro.

Tiffany: E aí, qual o resultado?

Áster: Um resultado impossível para a minha idade… Eu tenho 42 anos de idade, eu não posso estar grávida!

Tiffany: Claro que pode… Eu sabia que isso iria acontecer! E agora, o que você vai fazer?

Áster: Eu não sei… Eu não sei!

 

Após transarem, Áster e Luan conversam.

Áster: Então você não é casado mesmo?

Luan: Casado, eu? Jamais, nunca fui e nem me passa na cabeça ser!

Áster: E se caso em algum dia eu resolva sair dessa vida?

Luan: Daí, eu poderia pensar no caso!

Os dois dão risada juntos.

Luan: Mas agora eu tenho que ir!

Áster: Mas já?

Luan se arruma apressadamente, e do bolso da sua calça deixa um cartão cair, eles se despedem e Áster encontra o cartão ao chão.

Áster: Casa número 458, rua Afonso Sengger… Ele tem um escritório na sua casa.

 

Áster está na cozinha tomando café quando Tiffany chega.

Tiffany: Eu acho que precisamos conversar!

Áster: Precisamos mesmo!

Tiffany: Quando vamos tirar essa criança de dentro de você?

Áster: Daqui nove meses. De preferência, em parto normal!

Tiffany: Você vai ter essa criança?

Áster: Sim e vamos viver felizes com o pai dela. Ou dele!

Tiffany: E você por acaso sabe quem é o pai? Áster, você já tem 42 anos, deveria saber por quantos homens já passou aqui!

Áster: Eu sei. Como sei também que o único a fazer sexo sem camisinha comigo, foi o Luan!

Tiffany: Ele deve ser casado!

Áster: Não é nada!

Tiffany: E como você vai chegar até ele?

Áster: Ele deixou cair um papel com o número da casa e o nome da rua, onde fica o seu escritório… Tiffany, se tudo der certo hoje à noite eu largo essa vida e vou viver o que eu nunca pensei que iria viver antes.

Áster sai da cozinha.

Tiffany: Coitada!

 

A noite chega e Áster procura por Luan, em sua casa.

Áster: A casa dele deve ser aqui!

Um carro chega, Áster acompanha até ver Luan sair do carro.

Áster: Luan… (Áster corre até o carro) LUAN!

Luan olha para Áster, mas finge não conhecê-la.

Áster se aproxima de Luan – Enfim te encontrei, eu preciso te dizer uma coisa!

Luan: O que você faz aqui?

A mulher de Luan e a filha do casal saem do carro.

Beatriz: O que está acontecendo aqui, Luan?

Bianca: Papai, quem é ela?

Áster olha para Beatriz, Bianca e depois Luan.

Beatriz: Luan, quem é essa mulher?

Luan: É… Eu… Eu nunca vi essa mulher antes, ela deve ter se confundido!

Áster: É… Eu… Eu… Eu me confundi… Desculpe!

Áster sai caminhando e quando está longe do rapaz, começa a chorar e percebe que ele ficara a cuidar dela.

 

Áster chega à entrada da casa de prostíbulo. Aos prantos é recebida por Núbia e Tiffany.

Tiffany: Áster?

Núbia: O que está acontecendo?

Áster: Eu sou burra. Eu sou uma vagabunda imprestável que merece viver o resto da vida sofrendo e dando!

Núbia: Gente, mas o que aconteceu?

Tiffany: O que foi que aconteceu contigo, Áster?

Áster: Acontece que a otária acreditou que podia amar e ser amada, que aceitou a própria gravidez e acreditou em um homem que jurou não ser casado e não ter filhos, mas que descubro que tem uma filha e é… E é casado!

Núbia: Você está grávida?

Tiffany: Eu tentei te avisar, mas esse seu amor repentino por ele não deixou me ouvir!

Áster: E agora?

Tiffany: Agora? Agora é vida que segue. Não se prenda a ninguém… Eu irei respeitar a sua decisão se ainda quiser manter este filho, e pode ter certeza que eu irei ajudar em tudo.

Áster seca suas lágrimas – Eu vou… Eu vou manter este filho, eu vou ter essa criança, custe o que custar!

 

Áster estava acordada. Tinha passado a noite em claro pensando em tudo o que tinha acontecido a ela nas últimas semanas. Ela começa a escutar uns gritos que estavam vindo do corredor e se levanta da cama.

Luan adentra o quarto de Áster.

Luan: Áster, eu preciso falar com você!

Áster: Você? Como você teve a audácia de pisar os pés no meu quarto novamente?

Luan: Nós precisamos conversar.

Áster: Nós precisamos conversar? Eu quero mais que você morra seu cretino!

Luan pega na mão de Áster e tenta beija-la – Por favor, me perdoa, eu te amo!

Áster: Pois pegue esse seu amor e enfie no seu rabo… Eu te odeio!

Luan: Por favor!

Áster: Eu estou grávida de você e fui te procurar e descubro que você sempre mentiu para mim, que você é casado e tem uma filha.

Luan empalidece, ela para de ouvir o que Áster diz, no momento que ele escutou as palavras, “eu estou grávida”.

Luan: Este filho não é meu, não pode ser meu. Você transa com um monte de homens.

Áster dá um tapa na cara de Luan – Seu ordinário… Eu nunca transei com outro homem sem camisinha, só com você… Esse filho é seu sim!

Luan se senta na cama – Isso não pode ser verdade!

Áster: Mais é. E agora suma do meu quarto e nunca mais me procure.

Luan se levanta da cama – Acontece que dentre tantas mentiras que eu te contei, existe uma verdade escondida que eu nunca te falei!

Áster: Não tenho tempo para mais mentiras!

Luan: Eu sou soro positivo!

Áster empalidece – O quê?

Luan: Minha mulher é soro positivo e minha filha também… Eu tenho HIV.

Áster: Eu… Eu… Eu não posso acreditar nisso… Você acabou de vez com a minha vida.

Áster parte para cima de Luan.

Luan: Para (Pega nos braços de Áster) Calma! Não é o fim do mundo, existe tratamento. Existe o coquetel!

Áster: Eu estou com nojo de você. Eu quero… Eu quero morrer.

Áster grita e caminha pelo quarto em direção ao seu armário.

Luan: Eu… Eu vou… Vou para casa… E você… Você faz o que disse… Tentar me esquecer.

Luan vira as costas para Áster, que saca um revolver de dentro do armário.

Áster: Pode deixar, eu vou te esquecer…

Áster dispara um tiro e acerta a cabeça de Luan, que cai morto. Logo em seguida a arma cai da mão de Áster que não demonstra nenhum sentimento. Tiffany já estava na porta e Núbia aparece.

Tiffany: Áster, o que você fez?

Núbia: O rapaz tá morto?

Áster, sem mostrar algum sentimento – Eu matei o desgraçado!

Tiffany: Meu Deus, o que vamos fazer agora?

Núbia: Você tem que sumir do Brasil.

Tiffany: Isso mesmo, você tem uma boa grana guardada, eu posso te dar mais um pouco e você some do Brasil que nós iremos dar um jeito nele.

Áster começa a chorar e cai ajoelhada – O que eu fiz? Por quê?

Ela se rasteja até o corpo de Luan e põe a sua cabeça em cima dele, ainda chorando muito.

 

Em toda minha vida eu nunca estive dividida entre dois sentimentos que resolveram se misturar em um único dia: arrependimento e dor. Já tinha matado antes, mas era a primeira vez que fazia isso com alguém que amava de verdade. Talvez o meu destino seja este: sofrer. No Jardim do Brasil, eu sou o cravo de toda a história.

 

 

Próximo episódio: A formação na faculdade de direito é a concretização do sonho de Maria Lis que sempre foi determinada e decidida, mas a notícia de um câncer de mama a tira deste eixo de pessoa centrada e ela acaba por tomar decisões equivocadas que pioram sua dor.
Autor: Vítor Rodrigues
Data de publicação: 23 de fevereiro

5 thoughts on “Jardim Brasil [ep. 7]: A dama de preto

  • Não poderia deixar de prestigiar sua história e apresentar as impressões que tive da leitura da sua história, Gabriel. Primeiro que sua história vem com uma temática muito forte e abordar a prostituição que não seja de forma a ser condenar as mulheres por suas escolhas. Você apresenta uma visão diferente e contextualiza o momento em que Áster decide entrar na vida da prostituição. A cena com a fileira de homens e mulheres para deitar-se com ela lembra muito a cena do filme “Bruna Surfistinha” (sim, assisti este filme), mas não fiz comparações e mencionei aqui porque você construiu muito bem a cena, inclusive deixando os diálogos bem naturais mesmo que cause estranheza devido a situação geral.

    Áster tornou-se fria e sua história mostra isso até ela se tornar A Dama de Preto: intransponível, sensual e firme. Uma noite de sexo derrubou-a. Você a humanizou a partir deste momento. Continuava sendo mulher e é perfeitamente natural se apaixonar, se iludir – mesmo “não valendo nada”. Este é o ponto que mais me encantou na sua cena.

    O final foi muito impactante e a colocou na posição de sempre. Parecia que sua vida iria mudar, mas o ciclo continuava. Admito não ter ficado encantado com o final. Também não faria diferente. Fiquei feliz por ter fugido do final clichê de “puta bondosa” em que o passado seria apagado com um simples beijo de final de cena. Você deixou um ar de suspense e o próprio leitor pode criar uma nova história para a personagem.

    Parabéns!

    • Maravilhado por sua opinião, e agora que li novamente os comentários, percebi que muitos ficaram em dúvida quanto ao final de Áster, que agora explicarei.
      Áster não veio para deixar mensagens positivas de que “a vida é bela”, ela não veio para mostrar que com o amor a vida pode mudar, muito pelo contrário, ela veio para denunciar uma realidade “escondida” na sociedade, onde nem todas as garotas de programa têm as mesmas oportunidades de encontrar o amor e ser feliz, ou, ter a tão sonhada mudança de vida… Áster, nasceu para sofrer, cresceu sofrendo e teve o seu ápice no final da história! E se eu deixei alguma mensagem, foi sem meu consentimento, de verdade tá kkkkkkkkkkkkkkkk
      Eu me inspirei até demais no filme da Bruna Surfistinha kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
      Eu, desde o início quis fugir do final “puta bondosa” kkkkkkkkkkkkkkkk

  • Bem… O combinado não era escrever em roteiro, mas a trama prendeu o leitor. Seu português é bom. Contudo, algumas coisas ficaram meio óbvias, como por exemplo o fato de Luan não amar realmente Áster… Porém, isso trouxe a questão de prostitutas, como muitas mulheres, quererem homens que gostem delas como mais do que um mero pedaço de carne. Não senti uma rivalidade sincera entre Áster e Núbia, parecia que elas estavam brincando uma com a outra, só depois eu reparei que o lance deveria ser sério. O tema foi bem abordado, inserindo-a num contexto de prostíbulo. Inicialmente parecia não ter a ver, mas foi uma explicação de como ela foi parar naquela vida. Convenhamos que foi bem intenso o momento que “Francieli” disse que sua prece foi ouvida. Infelizmente muitas mulheres que almejam largar a vida de prostituição encontram muitas dificuldades e também desprezo… Enfim, o final triste, apesar de desgostoso, foi justo.
    Parabéns pela história!

  • Uma história forte que foi contada de maneira crua, sem sutileza e com uma dose grande de realidade. Gostei do seu estilo, porém creio que deveria ter se aprofundado mais no psicológico dos personagens. O conflito de Áster (muito bom por sinal, que ainda teve uma reviravolta perto do fim), poderia ter sido explorado a fundo para entendermos o que estava se passando em sua cabeça. Uma personagem rica e complexa, com uma história infelizmente triste.
    Parabéns pelo seu episódio!!

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