Contos de Hysteria

Capítulo 9 – Os Contos de Hysteria

Os Contos de Hysteria

Capitulo 9: Lar Doce Lar

Foi incrível o quão rápido eles conseguiram retornar até a Vila Hard Rock, chegando antes que aquele dia terminasse. Era verdade que estavam tristes e cansados, mas a visão do pássaro de trovão fora suficiente para que seus níveis de determinação chegassem ao máximo.

Durante todo o percurso até a vila haviam feito apenas uma parada assim que chegaram à fronteira entre a base das montanhas e a floresta sombria na qual haviam caminhado antes. Max havia alegado que precisava parar para se aliviar e aquelas foram suas primeiras palavras em um longo tempo. Não que Mary e Vincent estivessem no clima de conversar também, mas seu silencio era diferente do de seu amigo, que carregava uma atmosfera tão pesada que chegava a ser assustadora. Quando ele retornou, o leve inchaço em seus olhos estava aparente. Mary murchou ao vê-lo assim, mas sabia que Max estava dizendo a verdade. Ele fora aliviar o próprio coração. Doía nos dois amigos ver o menino daquela maneira mesmo podendo imaginar como ele se sentia. Sabiam que era muito para alguém tão jovem suportar.

 

Cerca de meia hora depois estavam novamente no Ás de Espadas, a taberna onde Mary trabalhava com o tio e Angus. A elfa deixou os rapazes a sós em seu quarto enquanto conversava com os pais no andar de baixo, lhe dando as devidas satisfações sobre sua repentina saída. Vinyl pode ouvir o tom severo, embora preocupado, dos pais de Mary e imaginou o quanto os seus próprios estavam preocupados. Não via a hora de chegar em casa e vê-los novamente, mesmo sabendo a bronca que o aguardava.

Logo Mary retornou ao quarto, com o rosto exausto. Ela abriu a porta e encontrou Max deitado olhando para o teto enquanto Vinyl lia as páginas do livro dos artefatos mágicos novamente, procurando avidamente qualquer informação sobre a pedra branca, já que eles ainda não haviam tido sucesso em descobrir o que ela fazia. Ele abaixou o livro quando ouviu a menina entrando, mas Max nem se mexeu. Era como se ele estivesse em outro plano de existência, perdido em seus próprios pensamentos. O anão mordeu o lábio nervosamente, já que a última coisa que queria era que Max se fechasse daquela maneira. Virou-se para Mary novamente e sua expressão gritava “Me ajude, por favor.”

Ela pareceu entender o recado, concordando levemente com a cabeça após soltar um suspiro. Ela caminhou e sentou-se na borda da cama de Max. — Meus pais concordaram que eu fosse com vocês até a Capital. Mas terei que voltar assim que a missão estiver completa. – ela começou dizendo, mas o garoto não moveu um músculo. — Angus estava lá também. Disse que pode conseguir os cavalos para amanhã cedo.

— É uma ótima noticia! Não é mesmo, Max? – Vinyl disse sentando-se corretamente na poltrona onde estava e colocando o livro de lado. Seu tom demonstrava o quão disposto estava em animar seu melhor amigo. Max continuou não dizendo nada. Apenas suspirou e concordou com a cabeça, sem desviar seus olhos do teto. A fagulha de animação em Vinyl desapareceu assim que seu amigo teve a reação, sendo suficiente para fazê-lo levantar e ficar de pé em frente ao corpo inerte de Max na cama. — Cara, você não precisa ficar assim. Não foi sua culpa. Além do mais, você é péssimo em fingir que está bem.

Max ergueu sua cabeça levemente em direção ao anão, erguendo uma sobrancelha confusa, o que fez Mary adicionar calmamente para não chateá-lo. — Sabemos que você tentou chorar lá na floresta… – Max desviou novamente o olhar, embaraçado, mas Mary rapidamente o ajudou a erguer-se e a se sentar na cama. — Você não precisa ter vergonha. É normal chorar quando se está triste… Só queremos que saiba que você não deve se sentir culpado.

Max suspirou agarrando-se aos próprios joelhos. Vinyl deu leves tapas em seu ombro, exibindo um meio sorriso. — Ela tem razão sabe? – ele disse, logo percebendo que Mary tentava copiar sua expressão empática, mas logo os dois pararam de sorrir, já que Max permanecia quieto. — Max…?

O menino finalmente abriu a boca depois de alguns segundos, mas não se atreveu a olhar para os amigos enquanto falava. — Eu… Eu sinto muito ter arrastado vocês nisso. Eu devia ter ido sozinho. – ele disse após uma pausa de silêncio. — É só que… Eu pedi a Harmos que me desse um protetor e eu não ligava se algo acontecesse com ele. Mas depois que eu percebi que Jack era bom… Eu não sei, talvez isso seja apenas uma piada cruel. – ele deu um longo suspiro antes de continuar. — E agora eu sei que a cena dele desaparecendo jamais vai deixar a minha cabeça. É como quando a minha mãe…

— Max! – Vinyl aumentou o tom pegando seu amigo pelos ombros. — Você precisa parar de carregar o peso do mundo nas costas. Jack se sacrificou por nós! Foi uma escolha dele. Não havia nada que podíamos ter feito, assim como não havia nada que você podia fazer quando sua mãe foi atacada.

Tanto o menino quanto a elfa pareceram surpresos com a reação do anão. Mas Vincent já vira seu melhor amigo refletindo sobres ações que ele podia ter tomado quando a mãe morreu centenas de vezes e sabia que não havia nada que um pequeno menino de quatro anos podia ter feito para salvá-la. Além disso, pensar nela agora não ia ajudar Max a se sentir melhor. Mary abriu a boca lentamente para perguntar algo, mas decidiu fechá-la novamente, percebendo que não era a hora certa para isso. — E coloca uma coisa nessa sua cabeça dura Max: Não estamos com você à força. Estamos aqui por queremos ajudá-lo! – disse o anão olhando bem nos olhos de Max. Ele finalmente desviou o olhar retirando suas mãos dos ombros do amigo. — Não tente enfrentar essa barra sozinho, está bem?

— É, estamos nessa juntos. – Mary reforçou com um pequeno sorriso.

Talvez em meio a sua terrível maré de má sorte, ter aqueles dois ao seu lado fosse uma grande fortuna, no fim das contas. Max sorriu. Sorriu genuinamente, mesmo que fosse a última coisa que ele imaginava fazer em uma situação como aquelas. Ele repentinamente puxou os amigos para um abraço que durou poucos segundos, mas o suficiente para que ele murmurasse “Obrigado” e os outros dois trocarem olhares aliviados.

Logo depois, Mary organizou uma cama improvisada para si mesma, insistindo que Max ficasse com a sua e Vinyl dormiu na poltrona, já que era o menor dos três. A menina já estava dormindo tranquilamente quando Max, que ainda estava acordado, escutou o anão chamando seu nome. — Max. – ele disse, e o menino conseguia ver apenas metade do rosto do amigo, que estava iluminado pela luz da vela dentro do quarto.

— O que foi carinha?

— Acha que meu pai vai ficar feliz em nos ver? Digo, talvez ele fique bravo já que desaparecemos por duas semanas. – ele perguntou, e mesmo no escuro, Max conseguiu o ver esfregando as mãos como sempre fazia quando estava nervoso.

— Ele sempre fica feliz em nos ver… Ele tem todo o direito de ficar bravo na verdade, mas não acho que supere o alivio de ver que estamos vivos. – Max disse refletindo um pouco. — Eu sinto falta dele também Vinyl.

— Ele saberia melhor o que fazer em certas situações. Acho que nunca fiquei tão ansioso em voltar pra casa.

Max deu um curto riso abafado antes de concordar com a cabeça. Ele sabia exatamente como seu amigo estava se sentindo, já que seu coração ansiava a mesma coisa. Alguns minutos depois, os dois finalmente pegaram no sono e a mente de Max começou a vagar pelo mundo dos sonhos.

 

Ele estava deitado no que deveria ser sua nova cama. Pop havia preparado o quarto para ele, esforçando-se para deixá-lo o mais confortável possível, embora a situação fosse difícil de compensar. Era um dia após o enterro de sua mãe, onde o jovem menino de apenas quatro anos fora obrigado a vê-la ser colocada debaixo da terra. Pop poupou-lhe de velá-la, pois as coisas já estavam suficientemente traumatizantes.

O menino passava grande parte do tempo no quarto, em silêncio. Queixava-se de que sua perna ainda doía devido ao incidente de ter caído da janela após sua mãe ter lhe instruído a fugir, mas o sábio anão sabia que não era verdade. A perna do garoto estava curada, mas seu coração provavelmente destruído. Pop bateu amigavelmente na porta do quarto segurando uma tigela de sopa quentinha, mesmo sabendo que era inútil, já que Max se recusava a comer.

— Max…? Posso entrar? – ele disse, sem resposta aparente. — Eu trouxe uma sopa… Fui eu mesmo quem fez.

Aguardou alguns poucos segundos antes de ouvir uma voz tímida e chorosa de criança dizendo “Entra”. Aquilo lhe trouxe um rápido alivio e então ele finalmente entrou, encontrando o garoto novamente encolhido entre os cobertores com o rosto virado para a parede. Pop sentia raiva de quem quer que tenha feito aquilo à Joan. Não apenas porque ela era como parte da família para ele e Umma, mas porque agora o pequeno Max havia perdido a pessoa mais importante da sua vida.

— Max… Por favor, fale comigo… — Pop disse aproximando-se devagar e exibindo uma expressão triste, mas ao mesmo tempo empática. — Eu não consigo imaginar como deve ser difícil, mas… Estou aqui para ajudá-lo.

— Não tem como a minha mãe voltar, não é? – Max perguntou segurando as lágrimas ainda sem se virar, o que fez Pop paralisar por um segundo sem saber o que dizer.

— Não garoto… Não tem como ela voltar… – ele respondeu tristemente, colocando a tigela de lado e sentando-se ao pé da cama do menino, mas redirecionou-se quando finalmente sentiu que ele estava se virando. Preferiu que ele não tivesse o feito, entretanto. Max estava com o rosto inchado e lágrimas recém-formadas escorriam de seus olhos enquanto ele se agarrava ao cobertor.

— Por que machucaram ela, tio Pop?

O anão fechou os olhos em angústia. Aquele era o tipo de pergunta que uma criança jamais deveria ter que fazer e encontrar uma resposta era horrível. Tudo o que fez foi sentar-se na cama e puxar o menino para perto de si, de maneira protetora, que praticamente o escondia, já que Max era muito pequeno. Doía em Pop saber a verdade e a provável resposta para aquela pergunta sem poder contá-la a Maxwell, mas ele sabia que era algo complexo demais para uma mente de quatro anos e que aquelas palavras escondiam um terrível perigo. — Eu não sei garoto… Mas pode ter certeza que quem quer que tenha sido, irá pagar pelo que fez… Um dia.

Max continuava a soluçar entre os braços de seu protetor. Sentia um vazio tremendo dentro de si. Sempre que se sentia triste, mesmo que esse tipo de tristeza fosse nova para ele, era sua mãe quem o tranquilizava. Mas ela não estava mais lá, e jamais voltaria. Mesmo sendo muito jovem, ele conseguia inconscientemente entender que sua fonte de confiança parental se tornaria outra pessoa em breve.

 

A lembrança mudou e a mente do garoto foi levada horas depois, quando Max havia finalmente se acalmado, e Pop havia tido sucesso em fazer com ele levantasse da cama, tomasse um banho e comesse alguma coisa, o anão o encontrou desenhando em seu quarto. Tinha traços infantis, é claro, mas era possível enxergar um homem de longos cabelos castanhos, barbado e intensos olhos dourados. Pop observou o desenho por alguns momentos, curioso, antes de perguntar a Max quem era o homem.

— Antes de fecharem o caixão, quando eu fui vê-la… Minha mãe tava usando aquela correntinha dourada, sabe? – ele disse e então seu rosto corou envergonhado antes de continuar. — Desculpa tio Pop, mas… Eu abri. De um lado tinha uma foto minha e do outro, uma desse homem. Ele é meu pai, não é?

A cor desapareceu do rosto do anão por alguns segundos antes que ele conseguisse voltar a si e o pequeno menino parecia estudá-lo já que ele piscava nervosamente. Finalmente ele deu um suspiro e concordou com a cabeça. — Mas também só o conheço dessa forma.

— Por que ele não veio ao enterro? A gente não devia avisar ele? – o menino perguntou quase de forma inocente. — Talvez eu pudesse morar com ele…

Pop pegou o desenho nas mãos antes que Max pudesse dizer qualquer outra coisa e colocou no bolso. — Garoto, sua mãe teve razões para deixá-lo longe do seu pai, está bem? É aqui que ela ia querer que ficasse… – Max olhou cabisbaixo para o chão, não entendendo bem porque todos, inclusive a própria mãe, queriam escondê-lo do pai. Pop ajudou ele a se levantar, colocando uma mão em seu ombro paternalmente. — Sei que está confuso, mas prometo que um dia você vai entender tudo. Tudo bem?

O anão o acompanhou até a cama, e lhe deitou, cobrindo-o para que ficasse quentinho e protegido. Max concordou com a cabeça sabendo que, assim como as conversas que tinha com Joan, argumentar sobre aquilo não levaria a lugar nenhum. Pop sorriu e bagunçou seus cabelos carinhosamente antes de começar a se levantar, mas foi interrompido por Max segurando sua mão. — Tio Pop… O meu pai é mau?

Novamente a pergunta lhe atingira como um soco no estômago, deixando-o em silêncio por alguns segundos, antes dele chacoalhar a cabeça suavemente para responder. — Não… Eu não sei Max. Eu te disse que não o conheço.

— Ah… É… – O menino disse infeliz, mas aceitando a verdade. — Desculpe.

— Não precisa se desculpar, foi apenas uma pergunta. – o anão respondeu tentando sorrir e soar amigável. Curvou-se para beijar a testa do menino. — Agora está na hora de dormir, certo? Boa noite, Max.

— Boa noite, tio Pop…

O menino deitou a cabeça confortavelmente no travesseiro e foi nesse momento que a lembrança se misturou ao sonho, pois um pássaro trovejante pousou em sua janela. Max o olhou por alguns segundos, curioso, antes que ele abrisse o bico e gritasse.

— Acorda Max! – o grito estridente do pássaro se misturou a voz familiar de Vinyl e ele percebeu que seu amigo o havia despertado, quando sentou-se abruptamente na cama de Mary. — Está na hora.

 

Os dois meninos, já trocados, desceram as escadas que dava para a Taberna onde encontraram Mary se despedindo dos pais, que agora estavam cientes de sua saída. Os dois elfos adultos entregaram aos três suprimentos suficientes para o resto da viagem, que estava resumida nos restante do prazo de apenas três dias. Eles agradeceram e foram apressados até o celeiro onde o pai de Angus vivia e alugava seus cavalos.

Como havia prometido, o menino que conheceram dias antes estava apoiado na cerca do pequeno estábulo na parte de fora do estabelecimento onde alguns cavalos estavam descansando. O sol brilhava em seus olhos extremamente azuis e o vento matinal batia em seus cabelos escuros. Eles se cumprimentaram e logo após, seu pai apareceu.

Para a surpresa de Max e Vinyl, o pai do elfo parecia extremamente humano. Ele não tinha as feições das contagiantes criaturas como seu filho e Mary tinham, e as rugas da velhice já pareciam ter-lhe encontrado, mas preferiam não ressaltar nada naquele momento. O senhor os levou gentilmente até os estábulos e Angus interrompeu a garota de segui-los, a chamando para conversar a sós enquanto os outros dois barganhavam um bom preço pelo aluguel dos animais com seu pai.

O elfo arrastou Mary para dentro de celeiro, e seu olhar se tornou aflito antes dele começar a falar. — Tem certeza de que quer fazer isso? Não acha que já fez o bastante por esses garotos?

— Angus… Sei que está dizendo isso porque está preocupado comigo. – ela respondeu  de braços cruzados e olhando para baixo, mas então ergueu o rosto para olhá-lo nos olhos e continuar. — Mas eu preciso terminar o que comecei.

Sua expressão caiu, claramente chateado. Mas ele a conhecia bem o suficiente para saber que não importava o que ele dissesse, ela seguiria em frente com o que quer que estivesse dentro de sua cabeça. Angus deu um longo suspiro. — Está bem… Apenas me prometa que vai ficar bem. – ele disse e para a surpresa da garota, ele lançou-lhe um beijo delicado na bochecha. — Eu não aguentaria te perder.

Mary corou com a expressão surpresa. Suas bochechas tornaram-se ainda mais rosadas quando ela percebeu que seu amigo de longa data também estava ruborizado. Ela se concentrou para não parecer tão surpreendida como estava e balançou a cabeça dizendo. — E-Eu prometo… – Antes que pudesse dizer qualquer coisa mais, os dois elfos ouviram a dupla companheira de Mary a chamando. — Acho que preciso ir agora…

Angus concordou e desviou o olhar timidamente, e logo a seguiu novamente até o estábulo. Max e Vinyl pareciam ter conseguido um bom preço por dois bons cavalos. Os dois garotos já estavam de prontidão montados em um dos animais, enquanto seguravam o outro, que pertenceria a Mary, por uma corda. Ela se despediu rapidamente, montou no outro cavalo e os três seguiram viagem.

 

Vinyl estava inicialmente tranquilo. Depois começou a ficar ansioso. Então se sentiu confuso e entediado, já que seus amigos pareciam ter perdido a capacidade de falar durante horas passadas do percurso. Mary, que geralmente era a responsável por quebrar silêncios constrangedores, estava surpreendentemente calada, devido ao acontecimento do celeiro, o qual ela não queria comentar com os outros dois de forma alguma.

Max também estava quieto pensando na lembrança com a qual tinha sonhado na noite passada. Sentia-se um pouco melhor depois de ter conversado com Vincent e Mary anteriormente, já que pode descarregar parte do fardo que o acompanhava. É claro que ainda pensava em Jack, em Aria, em sua velha e aconchegante cabana que ele teve tão pouco tempo para desfrutar, mas no momento seus pensamentos estavam focados no motivo que o levou a sonhar com aquilo. Talvez fosse apenas saudade de Pop, mas Max achava que fosse algo mais. Talvez agora que fosse mais velho, a hora de perguntar a seu pai adotivo sobre o verdadeiro havia chegado.

Só depois de alguns minutos dentro da própria consciência, o garoto conseguiu voltar ao mundo, se dando conta de que Vinyl estava falando com Mary às suas costas.

— Não imaginei que você fosse seguir com a gente até a Capital. – ouviu seu amigo dizendo para a elfa e finalmente quebrando a quietude.

— É, eu também não. Mas depois de tudo o que houve… Seria injusto com vocês não seguir em frente. Além disso, eu quero ir até o fim. Tenho minhas próprias duvidas com o tal Harmos, que preciso resolver. – ela disse em um tom determinado.

Max permaneceu calado, embora estivesse prestando atenção na conversa dos dois. Vinyl pareceu concordar com a cabeça. — Entendo… — Seu tom demonstrava que ele queria desviar-se daquele assunto, quase como uma forma de proteger Max. — Está ansiosa para conhecer a Capital?

Mary deu um meio sorriso na direção do anão. — Ah claro. – Embora ela estivesse conflituosa no momento, sua expressão era genuína, sincera. Era bom vê-la sorrindo, ainda mais nas circunstâncias nas quais eles se encontravam. Mas no fim das contas, ser ingenuamente alegre era uma das principais características do elfos e para ambos os garotos era reconfortante estar na companhia de alguém assim. — As terras mais ao sul sempre chamaram minha atenção. Invejo vocês de certa forma… Vivendo na capital do Rock e tudo mais.

— Mas você pretende mudar-se pra lá um dia? – perguntou o anão, curioso.

O rosto da garota tornou-se contemplativo, como se ela estivesse de fato refletindo sobre a pergunta. — Eu não sei… Na Vila tenho meus pais, meus amigos, a taberna… – ela disse pensativa, fazendo uma pausa antes de continuar. — Não sei se conseguiria abandonar tudo isso. Mas não é hora de nos preocuparmos com isso, certo?

Vinyl concordou com a cabeça, retribuindo o meio sorriso. — É… Você tem razão. – Max não pode evitar levantar uma expressão confusa. Vinyl sendo amigável com um elfo? E realmente querendo conversar com um? Ao mesmo tempo, ele deu um sorriso escondido para que seu amigo não visse. O garoto sabia que a missão mudara a todos, mas teve certeza do quanto seu pequeno melhor amigo estava mudado quando ele o apanhara pela camisa no dia anterior e o reconfortou. Vinyl nunca foi extremamente confiante, mas lá estava ele, ajudando Max a manter-se de pé, deixando de acreditar nas histórias estúpidas de Eddie. Max podia sentir. — Posso te perguntar uma coisa, Mary?

— Vá em frente.

— Eu ouvi dizer que elfos vivem muito. Digo, a contagem dos anos não funciona da mesma forma. – ele disse um pouco hesitante de que isso também fosse uma lenda mentirosa e que Mary tomasse sua fala como um insulto. — Bem… Quantos anos você tem?

De fato, Mary olhou para ele intrigada por alguns segundos sem responder a pergunta, mas logo depois ela soltou uma gargalhada e continuou rindo, fazendo com que os dois garotos no outro cavalo trocassem olhares confusos.

— Eu disse alguma besteira, não foi? – Vinyl perguntou cabisbaixo.

— Não! Não… – ela disse deixando o riso morrer devagar. — Não é isso. É que a sua pergunta é meio complicada. Mas você tem razão. Eu tenho cento e catorze anos. Mas para a minha espécie, não passo mais do que uma criança.

Os olhos de Vinyl se arregalaram com a revelação, enquanto Max parecia completamente perplexo. Vendo o choque no rosto de seu amigo, o menino não conseguiu segurar um riso abafado.

— Você… Nossa… – o anão disse ainda processando a informação na cabeça. — Você deve ter conhecido uma porção de anões.

— Na verdade, alguns. Eu sai poucas vezes da Vila, e como a maior parte dos cidadãos lá são elfos… Bem, a questão é que também não percebemos os outros envelhecendo. – ela explicou encolhendo os ombros. — Mas já conheci alguns anões sim, que passaram pela taberna. Já vi alguns até bem altos. Para anões, é claro.

Os olhos de Vincent se arregalaram quase como se uma frase de ativação secreta tivesse sido pronunciada. Max sentiu a agitação no garoto atrás dele. — Oh não… Eu não acredito que você disse iss… – o menino começou a dizer, mas foi cortado por seu melhor amigo que começava vomitar o assunto.

— Eu vou te contar um segredo. Anões altos você disse, não? Pois a família Vinyl possui os anões mais altos e fortes de toda Hysteria. Meu bisavô, por exemplo, diziam que ele era tão alto que as pessoas o confundiam com um homem. – ele contava todo animado, enquanto Max, que já tinha ouvido essas histórias milhares de vezes, virava os olhos segurando o riso. Vinyl estava diferente, mas certas coisas não mudam nunca. — Somos mais altos que a maioria dos anões pelo menos. Pode perguntar ao Max, ele vai confirmar.

— Me contou um segredo? Pensei que não confiasse nos elfos. – afirmou Mary olhando furtivamente para ele.

— Eu… Não confio. – ele disse em uma pausa. — Mas confio nos meus amigos.

Desta vez, Mary virou-se perplexa para o jovem anão. A fala a havia pego de surpresa, mas logo sua confusão transformou-se num sorriso radiante e seu riso contagiou os outros dois. Foi nesse momento que Max finalmente percebeu algo: Tudo ficaria bem. Talvez não tão bem quanto ele imaginava, é claro, e certas feridas abertas durante aquela jornada jamais cicatrizariam completamente. Porém, mesmo as coisas ruins que experimentaram seriam consertadas pelo tempo.

 

Quando os primeiros raios do último dia do prazo de Maxwell começaram a raiar no céu, os três garotos avistaram o castelo real da Capital. Fazia apenas duas semanas que Max e Vinyl não viam seu lar, mas depois de tudo o que passaram aquele tempo aparentava anos. A tranquila Capital mais parecia a Montanha Punk no momento, com o céu tempestuoso e ninguém nas ruas. Os dois não tinham certeza se os habitantes sabiam o que estava acontecendo no interior do castelo, mas imaginaram que sim, pois um local tão agitado como o centro de Hysteria, jamais ficaria tão deserto.

Ainda sim, estavam dentro do prazo e uma ponta de esperança após todos aqueles dias andando a cavalo surgiu no peito de Max. Ele virou-se suavemente para olhar os amigos. Vinyl olhava o horizonte com o olhar preocupado e Mary apenas confirmou com a cabeça seriamente o que fez com que o menino escolhido soltasse as rédeas de seu cavalo a fim de fazê-lo correr mais depressa.

Mary fez o mesmo para acompanhá-lo e em questão de minutos os três adentraram abruptamente pelo portão do castelo. O sol refletido nos discos de vinil espalhados pelos muros bateu em seus olhos por um segundo, fazendo com que descessem dos cavalos o mais rápido que podiam. Os três saíram em disparada até o salão do trono, onde Max havia sido incumbido de sua missão. Era também aonde ele tinha visto Aria pela última vez.

Quando entraram, entretanto, Max foi obrigado a parar onde estava. Não pôde acreditar no que estava vendo. O rei Reed e a rainha Scarlett ainda estavam amarrados em seus tronos, ao contrário de Harmos, que estava de pé. Mas garoto sentiu sua boca abrindo espantada, seus olhos de arregalando com o terror e seus joelhos fraquejarem quando ele percebeu que o Deus segurava uma familiar figura inconsciente em seus braços.

Aria estava morta. Maxwell Starr havia falhado.

 

 

Notas Finais do Capítulo:

O nome do capítulo foi escolhido baseado na letra da música “Home Sweet Home” da banda Motley Crue. Quando estava escrevendo quis que o capítulo inteiro tivesse o clima de saudade e esperança da volta ao lar que a música possui. Embora essa falsa sensação de segurança seja destruída no fim do capítulo que inicia o climax da história.

 

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